28 de fevereiro de 2017

A pressa







A pressa apaga do tempo a questão da escolha. Eu sempre tinha pressa. E pra quê tanta pressa? Levanta cedo, toma banho, se veste rápido, sai correndo, bate a porta, pega o ônibus, carro, caminhão, moto, bicicleta, metrô, patins! Chega no trabalho, senta na mesa, pega nas máquinas, atende pessoas, vende coisas, conta coisas, estoca coisas, anota recados, toma café, aponta o lápis, perde a caneta, bebe chá, chocolate, abre e-mails, abre janelas, abre portas, acaba o expediente, entra no mercado, olha o Airton Senna com o carrinho, compra cenoura, leite em pó, 1kg de alcatra, corre pro caixa rápido... chega em casa, outra maratona e corre até pra dormir. Na sexta ou na quarta dá uma quebrada e sai pra se divertir, sábado e domingo, solta pipa, joga bola, vai no shopping, compra coisas, come coisas, vê coisas, chega em casa... lá vem a segunda. Então nós corremos pra ter mais dinheiro, pra ter uma vida diferente, pra ter prestígio, status, pra ter orgulho de quem somos. Temos orgulho de quem somos? Você tem? No fim do dia as vezes a pergunta é:" O que nós somos?" É porque as vezes, durante o dia, acontece alguma coisa inesperada que estraga essa fachada da pressa, obriga uma freada brusca e o nariz bate de frente com Gabi rsrsrs, não, to só brincando, bate de frente com outra conotação, a paciência por obrigação. Ou não, as vezes o alguma coisa que acontece, te deixa na serenidade se perguntando: "Porque não passei por aqui devagar outras vezes?" Mas é a pressa, ela engole a paciência, engole nossas agendas e reforça a ideia de que tudo que é mais fácil, rápido e perto é melhor do que qualquer sentimento, argumento... cimento. É, eu escrevi cimento, não escrevi porque rima, escrevi porque a paciência é o cimento das situações, é a liga sabe, é a junção entre ser admitido num emprego novo e ser promovido tempos depois, é a transição da paixão pro amor, é o que se faz quando se planta uma lavoura, é o tempo de cozimento do peru de natal. Tivemos pressa pra crescer, tivemos pressa pra casar, só não apressamos o bebê, porque a cegonha não existe. Aí encontramos na vida, aquela pessoa que é como um jabuti... anda devagar, come devagar, bebe devagar, dança devagar e descobrimos que essa pessoa viu muita coisa que a gente não percebeu. Então acordamos de manhã, e perguntamos pra imagem no espelho escovando os dentes: "onde você estava esse tempo todo?". Alguns de nós vai se dar conta do que deixou escapar, desculpem, mas é necessário enumerar. Na pressa escapou a mulher da sua vida, o homem dos seus sonhos, aquela casa perfeita ou o apartamento, a promoção no trabalho, com todo aquele destacamento, ainda outro dia viu seu filho bebê, hoje de manhã ele saiu do quarto com 16 anos, aquela promoção do carro que você queria, aquele curso, a faculdade e o prêmio da loteria. É, as vezes nós não temos um momento. As vezes temos tantos momentos e temos tanta velocidade, é necessário pressa pra fazer tudo acontecer. Aquele livro ficou por ler, aquela mensagem não foi mandada.. aquele pedido nunca foi aceito, não houve tempo de ser feito. E o tempo cobrou a conta da pressa. Como eu disse, a pressa apaga do tempo a questão da escolha, e fica só a conta pelas demandas que a vida nos impôs por causa dela, da pressa! Sim, sim, eu sei que é necessário pressa, saímos do ventre e tivemos que andar e falar, nos mandaram pra escola e já logo nos perguntaram o que gostaríamos de ser ao crescer. O resto dá pra prever... na pressa muitos de nós crescemos sem crescer. E isso é triste, é um pecado, é como mandar embora sem beijo um namorado. A pressa é inimiga do João, da Conceição, do Salomão, minha e sua, meu irmão. E como eu vou terminar esse texto? Calma, você está com pressa? Vou contar como eu penso. A pressa, pra mim, é como um despertador maluco, toda vez que ela toca eu estou um passo na frente dela. Eu acordo antes da pressa, e se minha mente vai mais rápido, fecho os olhos e respiro, vamos devagar, acabou de amanhecer, é um novo dia se quisermos realizar sonhos sobre quem somos, é um novo dia pra recomeçar aqueles planos, é um dia diferente pra observarmos com lentidão e absorvermos com paciência, e quem dera pudéssemos fazer assim todo dia... então teria praia e mar, teriamos fotos e mais sorrisos, teríamos aquele dia, aquele momento, e aquela ocasião. Mas existem aqueles que mesmo na pressa fazendo o bem aos outros, poderiam pensar diferente, será que na paciência não se ajudaria mais? Mas o pior de tudo, e não vamos falar de quem ajuda, é que na pressa, qualquer coisa serve, não se pode escolher. É um caso a se pensar com calma. E eu vou ficar acordada pensando ... hoje não tenho pressa pra dormir, a noite é longa e o preço é justo.

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