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3 de maio de 2017

Porque eu sou contra a maioria das campanhas "modinha", de prevenção ao Câncer, nas mídias sociais?


E com esta foto "desabafativa", eu inicio o papo:

"- Coração na time line, hashtag secreta, foto em preto e branco, desafio aceito, etc, etc, e etc.

- Juliane, você tem câncer, você pode participar dessas campanhas?

- Não, não posso. 

- Porque?"

Tenho câncer, um linfoma de hodgkin, diagnosticado há 3 anos, já fiz 4 tratamentos incluindo um transplante, em busca da cura, estou me encaminhando pra mais um tratamento agora, que será o 5, e que será paliativo, apenas pra controle, porque o remédio que eu preciso, ainda não está disponível no hospital onde me trato pelo SUS, e a disponibilidade dele vai depender de verba e licitação, pra chegar a mim. E estas campanhas nunca me ajudaram, nem com a autoestima; porque, qual é a graça, da pessoa postar uma foto preto e branca, ela sendo saudável, pra incentivar mulheres mutiladas por câncer (eu tenho cicatrizes de catéter em 3 lugares diferentes, marcas de procedimentos com agulhas nas mãos e braços e 2 cicatrizes de biópsias que as vezes olho, e eu me sinto o Frankeinstein)? E eu não vejo a lógica, dessas campanhas quando olho pra mim mesma, aliás, não vejo nem graça, pelo contrário, acho desrespeitoso e afrontoso. O câncer, como qualquer doença grave, (que aliás eu defendo as práticas humanistas em caso de qualquer doença grave), abala a nossa autoestima de um jeito pavoroso, a gente engorda por causa de remédio, fica inchada, com cara de doente, a gente fica sem força pra executar nossas tarefas diárias, a gente as vezes precisa que nos deem banho e comida, a gente fica careca, se descaracteriza inteira até se olhar no espelho e não se ver, e outra, tudo é doloroso, não existe procedimento sem dor, quimioterapia enjoa, você vomita, fica sem comer, baixa a imunidade, tem que tomar injeções, tomar remédios pós-quimio que vão te fazer mal, vão te fazer alucinar. Desculpem, eu não vejo como uma hastag, e uma foto, possam ajudar. Ainda mais me tratando num hospital conceito no estado do Rio, que é o INCA, um hospital público de ponta, que oferece uma gama de amparos ao paciente, onde eu vejo, o que as pessoas necessitam. O hospital possui o INCA Voluntário, onde pessoas saudáveis, interessadas em ajudar (não com hastags e fotos), podem exercer atividades, de visitas, brincar com as crianças, na distribuição de cestas básicas, roupas,  sapatos e utensílios, tem gente que vai no ambulatório de quimioterapia e toca violão pra quem está se medicando. O hospital oferece uma gama de assistências, porque entende que vão chegar ali, pessoas de outros lugares, outras cidades, e essas pessoas as vezes não vão ter nem dinheiro, nem onde ficar, isso é uma realidade diária, real, latente. E com tudo isso, eu fatalmente, não posso reconhecer uma campanha "modinha", como ato de combate ao câncer.
Eu admiro muito o "Outubro Rosa", tenho que falar dessa campanha em específico, pois eles não são demagogos, são pessoas que saem nas ruas, fazem passeata, O "Outubro Rosa", (link do site, pra conhecer melhor: http://outubrorosa.org.br/objetivo/ ), surgiu do instituto Neo Mama (link do site pra conhecer melhor: http://neomama.org.br/), e eles estimulam a participação de empresas, governo, e é muito legal essa interação, porque essa é a interação correta, envolver a sociedade no combate, conscientizar o governo a mandar verba pra ter exames periódicos, pra ter aparelhos de diagnóstico. Porque o quanto mais cedo for detectado, mais rápido se cura, maiores são as chances de vida do paciente. Só que a rapidez, em muitos casos fica comprometida pela falta de estrutura dos hospitais e pela falta de verba, e aí eu pergunto novamente: Como uma foto de alguém saudável, em preto e branco, sem qualquer legenda, ajudaria? Não ajuda. Eu enxergo outras formas de representar esta causa tão importante, que citei acima; passeatas, cobrar o que se deve de governantes. A "prevenção" (combate) do Câncer de mama e de qualquer outro câncer, que na verdade se chama "combate", depende de exames periódicos, aos quais deveríamos ter direito adquirido pelo SUS e/ou na falta deles, esses exames deveriam ser providos por clínicas particulares com subsídios do governo, sabemos que não é assim, infelizmente, sabemos que não temos uma boa situação no país no que se refere á saúde pública. Agora, em relação a palavra mal empregada: "Prevenção do câncer", se é que ela existe, pode estar no estilo de vida e alimentação, porém há muitas controvérsias quanto a isso cientificamente falando, o câncer pode existir por fatores internos, hormônios, condições imunológicas, fatores externos, por produtos tóxicos ingeridos, substâncias químicas diversas, o Brasil por exemplo é campeão no uso de 14 agrotóxicos, mais tóxicos do mundo, banidos em muitos lugares onde a tecnologia e as relações humanas são bem mais respeitosas e avançadas, e aí vem a pergunta: Ao invés de usar a sua influência pra postar uma hashtag secreta, porque não usar a sua influência, combatendo as causas abertamente? Se unindo e lutando junto com uma instituição séria, pra que o país dê pra você, que também pode precisar dos serviços do SUS um dia, um atendimento digno? Porque você não sai da frente do seu computador e da tela do seu celular, e visita alguém com câncer, levando um bom papo, um sorriso, vai na ala das crianças, brinque com elas, leve brinquedos, faça uma campanha pra arrecadar cesta básica, roupa, sapato, distribua, não queime a sua mufa, tentando prevenir doenças graves postando fotos. O câncer, num ser humano, é detectável através de sintomas, checkups e biópsias.

QUANTO AO AUTO EXAME DA MAMA, (acho legal relembrar): Façamos sim! É bom, mas precisa ser sempre, SEMPRE, UMA VEZ POR SEMANA, QUANDO ESTIVER MENSTRUADA, QUANDO NÃO ESTIVER TAMBÉM, TODO DIA, que é pra você conhecer sua mama de hoje, e a mama de amanhã, e mama de daqui há um mês, assim, se acontecer algo diferente com ela, você vai saber e vai poder procurar um médico que te diagnostique.

E tem todo um script pra fazer o auto exame, em 6 passos:

1- Em frente ao espelho:
2- Posicione-se em frente ao espelho;
3- Observe os dois seios, primeiramente com os braços caídos;
4- Coloque as mãos na cintura fazendo força;
5- Coloque-as atrás da cabeça e observe o tamanho, posição e forma do mamilo;
6- Pressione levemente o mamilo e veja se há saída de secreção.

Detectou algo diferente, procure o médico!

Gaste tempo, na fila do SUS, vai demorar, nós sabemos, mas sua vida vale a pena, ou junte dinheiro durante o ano, e vá ao seu ginecologista, faça checkups, se cuide, se tiver plano de saúde, melhor ainda, não tem desculpas, cuide-se, sempre.

E como eu disse, o mais importante, não são fotos ou corações em murais, mas exames periódicos e cobrança de nós mulheres pelos nossos direitos aos nossos governantes! Esse país precisa nos reconhecer e acolher, como a mãe gentil que dizem que ele é. Quanto ás campanhas "modinha", espero ter explicado tudo com êxito e respeito. E pessoal, estou sempre aberta a cooperar, falar das minhas experiências com o câncer, ajudar nunca foi problema pra mim, o que eu não posso suportar, é que numa luta tão importante, as pessoas tratem esse assunto com fotos e hashtags, ou campanhas triviais, aí eu fico louca e a minha resposta pra isso, é:

"Não passarão",

Com muito carinho e respeitosamente,

Juliane Schimel, dona do blog Serena-West.


P.s.: DEIXO UM LINK DO INCA, PERGUNTAS E RESPOSTAS SOBRE CÂNCER, ACESSE E SAIBA MAIS:

http://www1.inca.gov.br/conteudo_view.asp?id=83

29 de março de 2017

Procura-se Colunistas Colaboradores para o Blog




Estou procurando COLUNISTAS COLABORADORES para o Serena- West (Blog)!!! Você escreve textos sobre assuntos variados? Sobre um assunto só? Você não escreve mas conhece alguém que escreve? Essa é uma boa oportunidade!!! Caso você se interesse, estou recrutando colunistas pra diversos assuntos, entre em contato comigo pelo meu e-mail:

julianeschimel@gmail.com  


P.s.: Não remunerado. 

4 de setembro de 2016

Se você escolher ler esse texto, é bom que tenha estômago.

Tendo em vista tudo que eu venho passando já há 1 ano e seis meses, sobre o câncer, eu acredito ter visto, e sentido, mais coisas que muitas pessoas que aderem campanhas de prevenção ao câncer na internet e outras mídias. E assim sendo, a última moda das fotos preto e branco, me deixou muito aborrecida, mesmo sendo prevenção, porque não foi feita de maneira clara, postar uma foto com uma legenda irrelevante, não é campanha, postar uma foto, não é campanha, não contra o câncer, e eu vou me explicar, porque tudo sobre câncer, quando você fala em diagnóstico, precisa ser claro. Eu fiquei me perguntando todos esses dias, se as pessoas que aderiram essa campanha, fizeram algum exame periódico em algum hospital/clínica, ou auto exames que são preventivos desde que que você não ache um nódulo. Porque o certo, o correto, é fazer exames hospitalares periodicamente. Eu não posso dizer que tenho câncer, porque achei um nódulo palpável em alguma parte do corpo. Existe um processo inteiro que envolve consultas médicas, exames de sangue e biópsias, que vão dizer se um nódulo é um câncer ou não. Quando eu procurei assistência médica, porque tinha nódulos no meu pescoço, eu passei por três médicos diferentes, até chegarem a conclusão de que eu precisava de uma quarta médica, que era uma hematologista, com ela, antes da biópsia, foram dois meses de consulta semanal. E sabem, meu estado clínico era visivelmente crítico. Existe um protocolo sobre o câncer, que diz que o paciente suspeito da doença, deve ser diagnosticado e entrar em tratamento em até 60 dias. E eu posso dizer pra vocês, sem sombra de erro, que isso existe para quem tem dinheiro. Meu diagnóstico demorou 4 meses, e eu depois desses 4 meses, foram mais 2 meses pra iniciar a quimioterapia. Hoje, a espera por uma biópsia, pode demorar até seis meses, dependendo do nível de importância que o médico der para o tratamento, o mesmo vale para cirurgias de remoção de tumores com metástases. Eu não estou vagando sobre estatísticas, isso é o que eu presencio todos os dias no hospital. A cidade de Petrópolis, não tem um centro oncológico que trata todas as doenças do câncer. Quando eu finalmente recebi o meu diagnóstico de linfoma pelo hospital Alcides Carneiro, que aliás devo ressaltar, não teria me atendido com urgência se não fosse a intervenção de um vereador, sem a intervenção dele, minha consulta inicial teria demorado quatro meses, enfim, quando recebi meu diagnóstico inicial, fui encaminhada ao CTO, debilitada, esperei por 6h até que fosse atendida por uma médica num encaixe. Dentro da sala dela, ela muito rude, me disse a verdade nua e crua: "Se você optar por se tratar em Petrópolis, eu posso te passar quimioterapia, porém, aqui eu não tenho PETSCAN, e não tenho como fazer o exame Histopatológico da sua bioópsia pra te dizer qual é o seu tipo de linfoma, eu posso até te passar uma quimioterapia, porém, sem saber se é a medicação certa, se eu fosse você, ia pro INCA, no Rio, se você ficar em Petrópolis, você vai morrer". Pra quem não sabe, o PETSCAN, é uma tomografia especializada, que usa o flúor como contraste, e esse exame vai além da tomografia, o PETSCAN capta a atividade do câncer, dentro de um tumor. E Petrópolis não tem. E eu me pergunto, como se tratam os doentes de câncer em Petrópolis? COM FOTOS PRETO E BRANCO, NUM MURAL DO FACEBOOK? Petrópolis tem 400 mil habitantes, digamos que 150 mil sejam mulheres, como essas mulheres se viram com apenas 1 mamógrafo gratuito? Quem pode pagar por uma mamografia semestral ou anual? Não vamos ser hipócritas. Escrevi tudo isso pra corroborar a minha luta, de que palavras, NÃO PRESTAM PRA NADA, NA REALIDADE DE QUEM TEM CÂNCER, E NA REALIDADE DE QUEM CUIDA DA PRÓPRIA SAÚDE. O que adianta uma campanha pra conscientização da prevenção, se não existem meios preventivos efetivos? Ou se quer meios rápidos e eficazes de diagnóstico? E ainda caímos em outro paralelo, não adianta você ler sobre uma luta, uma simples leitura, não te torna alguém experiente. E ainda outro extremo, ninguém iria pinta o rosto com tinta preta pra conscientizar a sociedade, de o negro precisa ser respeitado, até os gays fazem passeatas pra terem seus direitos respeitados, as feministas também se representam e muito bem, e todas essas pessoas não admitem que outras vocês pouco efetivas, manchem as suas causas. Então eu me pergunto: PORQUE EU FUI TACAHADA DE "CAUSADORA DE CASO", "FAZEDORA DE MIMIMI, QUANDO CHEGOU A MINHA VEZ DE REPRESENTAR A MINHA CAUSA, E DIZER QUE ACHEI UM ABSURDO UMA VOZ SEM NEXO, QUE FOI ESTA CAMPANHA DA FOTO PRETO E BRANCO, DIZENDO PRAS PESSOAS SOBRE UMA LUTA, DE FORMA ERRADA. Depois que eu e o meu noivo nos expressamos, li algumas postagens de pessoas que de doeram dizendo: "o mural é meu e eu posto o que eu quiser". Sim, o mural é seu, você posta o que quiser, MAS A LUTA É MINHA E EU DEFENDO A MINHA CAUSA COM UNHAS E DENTES. E a minha luta não é na internet, tentando mostrar que eu sou uma boa pessoa, postando foto de causa que eu não conheço, a minha luta diária, é por mim e por milhares de pessoas com câncer, que são abandonadas de todas as formas. A voz da nossa causa ainda não é forte como a voz do movimento negro, feminista ou gay, mas ela vai ficar forte, no que depender de mim, que sempre lutei pra tudo na minha vida, por tudo que eu estou passando, minha história não vai ser a história de uma guerreira de venceu o câncer, minha história é a história de alguém que dá voz a quem não tem.

23 de maio de 2015

Segunda- feira

Da série: [se você pudesse me ler]
(isso é só uma coisa que eu queria dizer, como tantas outras que os outros dizem, se você pudesse me ler...).
Eu estou me preparando psicologicamente pra segunda feira. O que eu posso dizer? Que odeio agulhas? Que vão picar meu braço pelos menos umas três vezes antes de achar a veia certa? Que não quero colocar um cateter? Não quero colocar um cateter, a médica disse pra mim da última vez: “Ainda estão conseguindo achar suas veias? Vai chegar uma hora que eles vão pedir pra colocar um cateter.”. A única coisa que eu pensei foi numa futilidade sem fim: “Não quero mais uma cicatriz.”. Egoísta não? Sou humana, não estou pronta pra lidar com isso. Não é romântico ser cortada e costurada, ou ficar com pontinhos roxos por causa de picadas. Alguém tem que dizer (de novo), pra Carolina Dieckmam, que cortar o cabelo não é a pior parte, eu tive que dizer isso pra mim mesma, a tia Ana também me disse. Por falar na Carol, foi divertido cortar o cabelo (agora que acabou), acho que estou pronta pra falar disso (só não estou pronta pra falar de amor). Minha tia Ana me contou os bastidores: “Quando a Débora estava lavando seu cabelo, ela me mostrou o quanto de cabelo estava caindo e eu fiquei assustada; depois que ela cortou e foi fazer a escova, eu pensei que seu cabelo ia cair muito.”. Eu disse que estava caindo, é que eu sou muito educada pra falar as coisas também, eu devia ter dito: “está caindo pra caral.*&%$!” , não, o que eu disse: “tá caindo, é que tenho mesmo muito cabelo, e não cai como nos filmes sabe, não sai um tufo inteiro de uma só parte da sua cabeça, sai fios da cabeça toda”. Bem antes de me sentar pra lavar o cabelo eu avisei: “olha, não repara não, é que está caindo muito.”. Ficou aquela coisa no ar, tipo “todo mundo sabe, filha, mas ninguém comenta.”. Ela lavou, eu fiquei calada quase o tempo todo, e rindo de nervoso, é da minha natureza. Fico só pensando nas coisas. Então me sentei na cadeira pra cortar. Era a hora, não podia voltar atrás. Deu vontade de dizer: “posso ir ali ao banheiro ter um ataque de pelanca? Já volto!? Não?”. Mas convenhamos, eu já estava ali, o cabelo caindo, ela com a tesoura, nada de mimimi (não por fora, por dentro eu estava gritando). Pra uma mulher, o cabelo é uma parte muito importante do corpo, é a moldura fundamental. Onde vou passar a mão quando eu ficar nervosa? O que vou prender quando eu tiver uma boa ideia, por que eu tenho essa mania..., em que vou passar a mão quando um cara bonito me paquerar, (como se isso fosse possível)? Foquei num ponto qualquer e coloquei a alma no automático, por dentro, pedi pra ser rápido. Ela cortou a primeira mecha. Me senti com 10 anos de novo. Voltei bem no dia que minha mãe cortou minha franja e eu não queria mais usar franja, por que já era uma mulher. Quis ter 10 anos de novo e quis minha franja (bizarra) de volta. Ela não demorou mais que 30 minutos cortando, e lá se foi meu cabelo (meu cabeloooo). A conversa se animou, esqueci meus medos e começamos a falar mal dos homens e de como são lindos e gostosos, (que é o que mulheres fazem em banheiros e salões de beleza, e falamos do Christian Grey), uma moça chegou deu boa noite e logo soltou a pérola do meu dia: “Nossa que moça linda, você é modelo!?”. Pensei por dentro: “ah, pára!”. Sorri, e fui cortez dizendo obrigada. Minha tia logo disse que não. Nossa beleza é uma coisa de família. Quando a Débora terminou o corte eu me olhei no espelho, acho que suspirei, vi meus lábios enormes e meus olhos enormes, e de novo aquela sensação de estar enfrentando uma coisa nova me invadiu, quem era aquela ali no reflexo do espelho? O que eu mais havia detestado nisso tudo era a minha cara de doença. Ali no espelho eu vi a mulher que eu gostaria de ser. Eu sempre digo (pra mim mesma e amigas), que antes de amar um homem você tem que ser a pessoa ideal pra você mesma, e ali eu me senti assim: a mulher da minha vida. Por que raios eu sempre tenho que ver o lado bom de tudo? Por que eu tenho que dar razão pra droga do pensamento positivo? É um talento que eu tenho (kkkkk), e muita prática em sempre ser a última da fila, aquela que sempre toma banho de poça d’água, é necessário muito bom humor pra lidar com as adversidades e por algum motivo no universo, eu sou a pessoa. Olha, tem gente que vê o câncer como um bicho papão enorme, e eu admito, tenho medo pra caramba, mas ele não me intimida, é difícil lidar com o fato de que somos uma bomba relógio caseira, mas são muitos anos trapaceando o azar, tirei meu diploma. Ah, o cabelo. O meu cabelo é mais um preço que estou pagando pra ficar boa, mas teve um dia que eu meio que olhei pro céu, já estava de noite, e já tinha estrelas (a culpa não é delas, já que tocamos no assunto), mas eu questionei sinceramente “por que eu”, disse pra Deus que ficar careca já era demais, afinal, eu já estou magra, disse que talvez era a hora em que ele deveria rever o roteiro do meu filme. Daí me veio na cabeça o que Rumi escreveu: “Eu irei oferecer meu coração para aquele que está doente da mesma doença. Os doentes podem beber a mim como se eu fosse um elixir.” O meu cabelo é preço pequeno diante disso, se eu ainda puder sorrir ou escrever. Eu não encaro o câncer como o fim da minha vida, de qualquer forma, por que não sou que decido sobre a vida e a morte. Tem uma coisa que eu estou tentando dizer, é que, eu também não estou preparada pra fazer quimioterapia, mas estou lá de quinze em quinze dias, sorrindo. Quando a enfermeira não acha minhas veias, eu não reclamo, ela pede desculpas, acaricia minha mão e viramos boas amigas. Não é só vocês que se compadecem, eu queria muito dizer isso pra minha família, as vezes vejo que carregam esse fardo sozinhos, especialmente minha mãe e a tia Ana, dá pra ver nos olhos sabe, as pessoas ficam querendo tirar minha dor, infelizmente, e acho que elas também pensam assim, não é algo que passe com mertiolate (é assim que escreve?). As vezes nós, os doentes, também entramos numa onda de autocompaixão (acho que isso pode ser um tanto óbvio, ninguém é de ferro), tem dias que eu nem quero lembrar que estou doente, por que sou vaidosa, egoísta e por que eu sou um pouco fútil também. Minha preparação psicológica inclui meu remedinho de enjoo, sou chatinha quando fico enjoada, não gosto que me toquem, não quero que me vejam vomitando e sim, se eu puder, após vomitar eu retoco minha maquiagem, por que não estou pronta pra me olhar no espelho e  ver qualquer pontinha que indique que eu possa vir a fracassar. É uma coisa que todo meu ser faz em conjunto. Um equilíbrio total entre mente, coração, alma, espírito e estômago e/ ou fígado. E cortar o cabelo mexia com esse equilíbrio, agora eu acho que não mexe mais. Fazer “quimio” ainda mexe com esse equilíbrio, e tudo que penso é em não desequilibrar quem me carrega quando eu fico mal depois da sessão, é uma arte, eu concluí que viver é uma arte. E Rumi tem a completa razão.
“Seja como o sol pela graça e misericórdia
Seja como a noite para cobrir as faltas dos outros
Seja como a água corrente pela generosidade
Seja como a morte para a raiva e o ódio
Seja como a terra pela modéstia
Pareça ser aquilo que você é

Seja aquilo que você parece ser.” (Rumi, poeta sufi)

19 de maio de 2015

Câncer

Da série: [se você pudesse me ler]
(isso é só uma coisa que eu queria dizer, como tantas outras que os outros dizem, se você pudesse me ler...).
Como eu ia dizendo, o câncer rouba muita coisa da gente, mas eu também sou trapaceira. Bom, eu acredito que ter qualquer doença não seja fácil, já tive resfriados em que não aguentei sair da cama, quem nunca? E sempre que ficamos doentes, bem, existe uma norma de conduta, se não sabe o que dizer, é simples, não diga nada, aos que sabem, meu “muito obrigada”. Desde meu diagnóstico eu passei por muitas fases... É difícil enumerar por ordem o que o câncer fez comigo, então vou mencionar o que em mim teve mais impacto. Minha primeira pior experiência foi o dia do primeiro diagnóstico, quando me disseram que era só um cisto, quisto, seja lá o que fosse, eu pensei, “a mensagem que meu corpo está me passando é de algo mais grave, alguém, por favor?”. Me vi em pouco sem saída. No dia meu pai ficou tão feliz que resolvemos sair pra comemorar, só um caroço pra ser retirado com uma cirurgia. Mas eu não me convenci, eu sabia que não era só aquilo. Guardei aquilo pra mim. Então o cirurgião me transferiu pra uma hematologista, (dois santos na terra). Logo depois veio a biópsia, não consigo me lembrar na minha vida, de um dia que tenha sido tão longo e cansativo como aquele, lembro-me de ter chorado muito, lembro-me de não ter forças se quer pra andar, lembro-me de três mãos apertando as minhas, a primeira da minha médica, que disse: “Ju, nós não vamos desistir, vou conseguir sua biopsia pra hoje ainda, nem que eu precise arrumar outro médico!”. A segunda mão foi a do médico que ela “improvisou”, ele segurou minhas mãos com as duas dele e disse que tudo correria bem. A terceira mão foi a do médico que ela tinha conversado pra fazer minha biopsia, ele tinha ficado preso na serra por causa de um acidente, ele pegou minhas mãos e disse: “Vamos lá!”. Durante certo tempo o câncer me roubou a cor, eu era apenas branca como uma folha de papel, e frágil, e ficar acordada durante uma cirurgia e saber que estão tirando uma parte sua pra te dar uma má notícia, não é legal. Hoje eu olho a cicatriz na axila, e admito, me incomoda, assim como as outras cicatrizes, a da biópsia da medula que é diferente da cicatriz da axila, é só um ponto na minha lombar, ela me incomoda, é minha lembrança de superação. Marcas de superação. Tem dias que eu preciso muito chorar. O câncer me roubou a autonomia. Sabe, eu montei toda minha casinha dos sonhos, morar sozinha é um barato! Andar de meias pela casa é um hobby pra mim, entre outras coisas que fazemos quando estamos no nosso lar e nenhum um outro lar é melhor que o seu, pois ele pertence a você. Aquele era meu lar, o lugar onde eu finquei as raízes da Juliane. Atingi o auge máximo que uma pessoa solteira ambiciona na sua autonomia, parei de lavar as roupas na lavanderia e finalmente comprei minha própria máquina de lavar; 8kg, com economia de água, chupa essa manga! A máquina só faltava falar! Mas como essa seria uma boa história de superação se eu não tivesse o amor incomensurável da minha família? Pusemos tudo num caminhão e lá se foi minha máquina pro sótão da casa da minha avó. Sonhos em conserva e devidamente empacotados, estes ficaram pra depois. A biópsia da medula. Putz, aquilo foi doloroso. Ficar na posição fetal sem ser um feto, e sabendo que vão usar uma agulha e o caramba pra pegar um pedaço do seu osso, não é legal. Eu estou magra, 10kg pra quem já era magra fazem muita falta, ossos quando batem, doem hahhaha, o caso é que não achavam o meu osso! Eu não gosto nem de lembrar, no lugar de dois furos, me fizeram cinco. E a anestesia? Não me lembro dela ter feito muito efeito. De um a dez, a escala da minha dor foi 9.9, o dez eu guardei pras inúmeras vezes em que ainda vão furar meus braços com agulhas. Quando eu olhei pro médico lindo que fez a biópsia de medula, eu estava chorando copiosamente, tive a impressão que ele queria me pedir desculpas. Ele era lindo mesmo, moreno, nem tanto, barba por fazer, nem tanto, alto, voz de locutor de rádio, (meu número kkk), eu chorando de dor, me senti estúpida, não por ele ser lindo, mas por eu sentir dor. Nunca esperamos que na vida, certa dor nos está de certa forma, de algum modo, em algum momento, predestinada. É disso que eu me lembro de quando ao longo que desses meses encontrei várias pessoas no meu caminho, umas realmente me apoiando, outras apenas curiosas, umas outras educadas, umas poucas sem palavras, e bem... Algumas, realmente idiotas. Ouvi certa vez o seguinte: “Essa doença é um pecado que você cometeu. Peça perdão pra Deus que ele te cura”. Outra: “doenças como a sua são as mágoas que você tem guardadas, você precisa liberar perdão”. Como uma pessoa sensata lida com isso? De maneira sensata, eu suponho. Mas como eu não tenho mais nada a perder e sou uma sensata com requintes de lunática, e não me levem a mal, eu não esperei as frases serem terminadas, eu virei as costas literalmente, por que eu sou muito capaz disso e fui viver, eu sou desapegada demais as vezes. Já me taxaram de fria, mas sou pragmática. Pra que discutir com alguém que não nos conhece? No final, acaba sendo sensato, que sejam felizes com suas filosofias, a minha é, Deus não tem nada a ver com isso, meu corpo de defeito, deu zica mesmo sabe, a medicina explica, estamos tratando, se Deus quiser fazer algo através disso, não se preocupem, eu não estou preocupada, ele é o dono da casa. Então, onde estávamos? Sim, ter um câncer nível, estágio, fase  QUATRO (4) chame do que quiser, não é legal, assusta, é grave. É como estar na última fase do seu jogo preferido e saber que não pode dar reset e recomeçar na primeira fase, é como estar na tábua da beirada de um navio e lá em baixo o tubarão. Lidar com a morte todo dia, saber que pode ter uma embolia pulmonar e simplesmente deixar de existir, dá medo. As vezes eu tenho que chorar em silencio por causa disso, por que a sensação que dá é que ninguém vai entender realmente o que eu estou passando, que na verdade não é só um câncer, é a minha vida que eu estou agarrando, mesmo com câncer. Então, o câncer é meu, é um problema que eu agarrei com as minhas mãos e estou tentando resolver, embora seja plenamente amada por isso e apesar disso, e não tenho vergonha disso. E por ele estar dentro de mim, às vezes tudo se mistura. Perdi um amor, mas disso não vou falar, não sei quando, mas teve um dia que desisti, só desisti. Desistir dos cabelos. Não desisti, tenho que agradecer a Débora, mil vezes, por mil anos, por ter feito esse corte no estilo daquela garota Hanna Montana rebelde kkkk, qual é o nome dela? Nunca lembro, minha memória falha as vezes. Eu rezo pra não ser dramática, quero ser prática, mas as vezes eu caio nesse pecado do drama, e puxar seu cabelo e ver ele saindo na sua mão... não é legal. Eu achei que estava preparada pra isso, afinal, não estava. Eu chorei sozinha com um tufo de cabelos nas mãos por meia hora me imaginando feito um  “E.T.” com a cabeça lisa como um ... como o que? Eu não sei, não quis pensar muito, não quero pensar nisso, mas o cabelo, justo o cabelo que tá bem ali onde eu penso.. quase na minha cara. Então a gente tem que pensar que são coisas da vida, propósitos divinos e a nossa vida parada, e questionamentos surgem de todos os cantos da alma, e eles quase gritam: “Doente e careca, quem vai me querer?”,  “Vão me olhar com pena”, “Ou não vão nem olhar, vão evitar”, “Minha vida está parada e agora?”, “qual será o meu futuro”. Guarda isso, vou dizer a última coisa que mais me impactou e vou usar essa última questão só pra explicar por que não é necessário me desejarem mais força. Fazer tomografia, pet scan, exames de sangue toda semana, e os caramba, o procedimento mais simples de todos, envolve agulhas e meus braços e mãos, tenho marcas, e se eu não aguentar o tranco, bem, ultimamente eu choro. Chorar em publico não é comigo, sou do tipo que aguenta sorrindo, mas tem hora que não dá. Mas “tá de boa”. Quero falar da minha última quimioterapia, descer a serra de Petrópolis, entrar num hospital e sentar numa maca sabendo que vão furar seu braço e depois de tudo você ainda vai vomitar, não é legal. Dessa última vez me parece que vomitei minha alma. Fiquei até com medo de dar descarga e deixar minha coragem descer junto. Minha sensação essa semana quando minha mãe quis falar sobre a próxima quimioterapia, foi de náuseas. Eu escondi a bolsa, os sapatos e as roupas que usei naquele dia, por que parecia que eu estava sentindo o cheiro dos remédios e depois eu tive vontade de sumir por alguns minutos. No dia da quimioterapia eu fico mal, não dá pra andar, teve uma vez que vi as coisas em dobro, meu pai me segurava pra eu entrar no carro, e ele disse assim: “Põe seu pé dentro do carro filha!” e eu respondi rindo: “qual dos quatro?”, me pareceu engraçado. E bem, a medicação é forte, minhas veias dos braços doem, então é aí que eu penso: “Qual será meu futuro?”, é agora que você entende por que não precisa me desejar nada... Eu já tenho as minhas respostas, estou plena. Acredito que pelo menos uma vez na vida todos os seres humanos recebem a oportunidade de reconhecerem que são plenos e isso só acontece em dois casos, o primeiro, diante da vida e o segundo diante da morte. Eu recebi o dom da vida ao nascer dos meus pais (faço questão de ressaltá- los, tudo que eu sou vem deles, do dedão do meu pé até meu último fio de cabelo), usei esse tempo pra crescer e aprender muitas coisas, eu aproveitei tudo ao meu redor (dentro dos meus princípios, sem escrúpulos), e fui colocada plena diante da morte, mas eu fui (sou) tão amada, que na verdade não me importaria morrer, e a morte (embora me amedronte muito mais pelo desconhecido), eu acho que ela não suporta o amor, por que é o amor que tem me sustentado e acho que ela também não suporta as verdades de quando somos honestos (serei redundante e vou escrever errado srsrrs), “conosco mesmos”. E eu nem deveria ser tão pretensiosa, isso pra alguns deve ser até grosseiro da minha parte, mas bem... Estou plena em vida, descobri que todas as respostas que eu preciso pra hoje, eu já tenho, que tudo que eu sonhei, foi conquistado, que as pessoas que eu amo e que completam minha vida, já estão ao meu lado, e o futuro... É agora, meu futuro é a minha vida e a minha morte. E o câncer está indo embora dela, (segundo minha médica, Dra. Márcia, linda e simpática). Então, o medo na verdade é uma coragem, e devo apenas concluir que sou só uma pessoa com um sonho pra sonhar, e que se eu me misturar na multidão (que Deus me permita), nem vão perceber que na verdade eu sou uma trapaceira e enganei a morte.

Essa é a minha marca de superação.