22 de novembro de 2015
Cântico de serenidade
Eu faço listas. E na minha lista mental com post-it's mentais cor de abóbora, eu escrevi: "Evite falar de problemas", numa clara tentativa de ser positiva, otimista e grata por tudo. Mas de repente essa premissa foi ficando complexa. E o "evite falar de problemas", tornou-se em uma clara irritação. Ao invés de me tornar serena, me tornou numa fogueira. Sem dúvida, eu claramente comecei a queimar por dentro. É que falar de problemas, é um hábito. Um hábito que aprendemos com as nossas mães, que aprenderam com as nossas avós, que aprenderam com as nossas bisavós, que aprenderam com as nossas tataravós, que aprenderam com suas primeiras ancestrais australopitecas (seja lá, o que isso quer dizer!). E quando de repente resolvemos mudar os hábitos e entoar outro mantra, parece que tudo ao redor é um problema, "gigantenorme", e parece que todos ao redor são um problema, e você tem um problema, e você é um problema. Então, antes de se habituar com o mantra da serenidade, você entra em plena combustão e contradição. Vou exemplificar, existe um cântico chamado Gurugita, esse cântico é usado em manhãs de meditação na Índia, é um cântico longo, de 182 versos, escrito em sânscrito, que leva uma hora e meia pra ser cantado por inteiro, e ele deve ser entoado no raiar do dia, em jejum, logo após ás (mais) uma hora e meia de meditação usual. Não vou explicar aqui, o que diz o canto, mas explicitar, que para mim, exercitar a serenidade é tão difícil quanto ter que executar uma tarefa parecida, pela manhã, sem café. Eu fico me sentindo enraivecida, irritadiça, invadida, (e outros adjetivos menos usáveis). E nas últimas semanas, foi o que a perspectiva dos problemas fez comigo. Me mutilou pelo fogo, me consumiu. Me vi paralisada fazendo uma prece única: "Deus, me ajuda, me ajuda, me ajuda". É assim que acontece quando tudo ao redor parece desabar, desmoronar, escorrer pelos dedos, ou quando por qualquer motivo você se olha no espelho e sente que está de fato mutilado(a). E eu, lembrem-se, estava claramente, tentando "evitar falar de problemas". Mas ao invés de entoar o mantra: "eu creio que tudo saíra bem", eu me peguei, diversas vezes fugindo disso, raivosamente, ferozmente, ardilosamente. Por diversas vezes, permiti minha mente vagar no mar da problemática. Mas a constante tentativa de "evitar falar de problemas", veio tomando outra proporção. Na medida em que eu evitava falar e acabava falando do problema, eu comecei a me sentir infantil, como uma criança reclamando do doce que acabou, e por consequência, ainda falando sobre os problemas, eu comecei a me constranger, e ainda pior, ainda mantendo o pensamento firme em "evitar falar de problemas", mas ainda sim falando, eu comecei a perceber que os problemas não tinham àquela dimensão de antes, eles pareceram menores, e por conseguinte, tão insignificantes que eu não mais precisaria falar deles, ou me incomodar com eles, eles começaram a ter uma importância diminuta. Isso facilita tanto a vida. Me dei conta que os problemas domésticos são os mesmos e ainda irão me incomodar, mas eu posso recorrer à serenidade da alma pra lidar com eles, e saber que mesmo com razão, posso me dar até ao luxo de perdê-la, por hoje vejo algumas coisas com outros olhos, posso virar páginas, escrever outras histórias, escrever novos livros, ou até mesmo livros que eu havia esquecido (entenda-se "livros", por vida). Esse mantra da serenidade que estava me incendiando inteira, (uma luta de anos), virou uma chama constante e vibrante, espalhando luz sobre o meu corpo, tornando o exército de refletir, mais claro, maduro, conciso. Não alcancei a perfeição, porque os problemas são reais, alguns bem palpáveis, mas sinto o velho medo indo embora. Sinto as mentiras caindo em contradição, se desfazendo, sinto minhas verdades brotando vagarosamente, a cada problema discutido em que começo a enxergar o meu real tamanho diante deles. E durante anos eu convivi com a frase: "Nenhum problema é grande demais pra você", antes eu não sabia ao certo como me comportar diante disso, hoje, eu me vejo entoando o cântico da serenidade, que nada mais é, do que um diálogo interno, onde falo comigo e falo de mim para o meu criador. E quando você aprende este cântico, por mais que ele o queime e machuque no início, quando você o aprende e se habitua, sua alma faz reverência ao problema ao invés de se curvar rendida. Uma reverência a um adversário digno de ser enfrentado, e não subestimado, mas derrotado. Por mais que você precise conversar sobre um problema, e não se furte disso, não deixe ele te consumir até você se curvar, mantenha o cântico em seu coração, exercite serenidade, e se você tropeçar na serenidade e cair no medo, no desespero, na desesperança, etc, (por que são coisas demais pra serem citadas), se isso tudo te fizer fumegar, comece o cântico de novo, e de novo, e de novo, e repita, repita, diga p você, se acostume a vencer. Não importa o quanto você repita, eu uso a premissa do Gurugita pra exemplificar: "se você puder cantar esse cântico por 7 vezes", você nunca mais precisará cantá-lo, por que ele habitará em você e você será uma canção viva. Mas é necessário buscar, explorar, insistir, porque é na constância que mora a conquista. Eu apenas iniciei a jornada, ainda existem problemas a calar, e serenidades a explorar, e hoje, domingo, eu acredito que posso fazer isso, e o cântico pra achar a serenidade funciona especialmente quando você oferta ele pra alguém, além de você, além de Deus, se é que você me entende! ( por que também, não vou te dar de mão beijada o conhecimento, né? Assim você não vai procurar a jornada, não vai explorar! E sem a emoção da busca a jornada não tem a graça proposta!).
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