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10 de junho de 2017

Almeida Garrett – Possuir-te é Gozar de um Tesouro Infinito




Que suprema felicidade foi hoje a minha, querida desta alma! Como tu estavas, linda, terna, amante, encantadora! Nunca te vi assim, nunca me pareceste tão bela! Que deliciosa variedade há em ti, minha Rosa adorada! Possuir-te é gozar de um tesouro infinito, em esgotável. Juro-te que já não tenho mérito em te ser fiel, em te protestar e guardar esta lealdade exclusiva que te hei-de consagrar até ao último instante da minha vida: não tenho mérito algum nisso. Depois de ti, toda a mulher é impossível para mim, que antes de ti não conheci nenhuma que me pudesse fixar.

E o que eu te estimo e aprecio além disso. A ternura de alma verdadeira que tenho por ti. Onde estavam no meu coração estes afectos que nunca senti, que só tu despertaste e que dão à minha alma um bem-estar tão suave? Realmente que te devo muito, que me fizeste melhor, outro do que nunca fui. O que sinto por ti é inexplicável. Bem me dizias tu que em te conhecendo te havia de adorar deveras. É certo, assim foi, e estou agora seguro deste amor, porque repousa em bases tão sólidas que já nada creio que o possa destruir. Deixaste-me hoje num estado de felicidade tal, com tanta serenidade no coração, que não creio em toda a minha vida que ainda tivesse um dia assim. A minha imaginação foi exaltada, tão difícil, nunca foi além das doces realidades que tu me fazes experimentar.

Tinha desesperado de encontrar a mulher que Deus formara à minha semelhança – achei-a em ti, e já não desejo a vida senão para gozar contigo e para me arrepender a teus pés do mal que fiz, do tempo que perdi, do que te roubei da minha existência para o mal empregar nas misérias de que me tenho querido ocupar. Digo – que me tenho querido, porque não consegui nunca: o meu espírito rebelava-se, o meu coração ficava indiferente, nunca foram de ninguém senão teus. Não penses que exagero: por Deus te juro que assim é, e que me podes crer: eu a ninguém amei, a ninguém hei-de amar senão a ti.

Almeida Garrett, em Carta a Rosa Barreiras.

Fonte: http://homoliteratus.com/10-cartas-de-amor-de-grandes-escritores/

9 de junho de 2017

Fiodor Dostoiévski – Não Sou Digno de um Anjo Tão Doce como Tu




Bom dia, anjo querido, beijo-te muito. Pensei em ti durante todo o caminho. Acabo de chegar. Sinto-me cansado e instalei-me para te escrever. Acabam de trazer-me chá, e água para me lavar, mas no intervalo escrevo-te umas linhas. (…) Na sala de espera da estação andei de lá para cá a pensar em ti e dizia comigo: mas porque deixei eu a minha Anuska?

Recordava tudo, até ao mais ínfimo escaninho da tua alma e do teu coração. Desde que casámos que descobri não ser digno de um anjo tão doce, tão belo, tão puro como tu – e que crê em mim. Como pude eu deixar-te? Para onde vou? Porquê? Deus confiou-te a mim para que nenhuma das riquezas da tua alma se perdesse – pelo contrário, para que tudo se desenvolva e floresça rica e esplendorosamente. Deus entregou-te a mim para que, por ti, eu resgate os meus enormes pecados, ao apresentar-te a Ele amadurecida, conservada, salva de tudo o que é baixo e ofende o espírito. E eu (…) eu o que faço é perturbar-te com coisas tão estúpidas como a minha viagem a este lugar.

Texto de Fiodor Dostoievski, em Carta a Anna Grigórievna Snítkina (1867).

8 de junho de 2017

Das Vantagens de Ser Bobo



O bobo, por não se ocupar com ambições, tem tempo para ver, ouvir e tocar o mundo. O bobo é capaz de ficar sentado quase sem se mexer por duas horas. Se perguntado por que não faz alguma coisa, responde: "Estou fazendo. Estou pensando."

Ser bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os espertos só se lembram de sair por meio da esperteza, e o bobo tem originalidade, espontaneamente lhe vem a idéia.

O bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não vêem. Os espertos estão sempre tão atentos às espertezas alheias que se descontraem diante dos bobos, e estes os vêem como simples pessoas humanas. O bobo ganha utilidade e sabedoria para viver. O bobo nunca parece ter tido vez. No entanto, muitas vezes, o bobo é um Dostoievski.

Há desvantagem, obviamente. Uma boba, por exemplo, confiou na palavra de um desconhecido para a compra de um ar refrigerado de segunda mão: ele disse que o aparelho era novo, praticamente sem uso porque se mudara para a Gávea onde é fresco. Vai a boba e compra o aparelho sem vê-lo sequer. Resultado: não funciona. Chamado um técnico, a opinião deste era de que o aparelho estava tão estragado que o conserto seria caríssimo: mais valia comprar outro. Mas, em contrapartida, a vantagem de ser bobo é ter boa-fé, não desconfiar, e portanto estar tranqüilo. Enquanto o esperto não dorme à noite com medo de ser ludibriado. O esperto vence com úlcera no estômago. O bobo não percebe que venceu.

Aviso: não confundir bobos com burros. Desvantagem: pode receber uma punhalada de quem menos espera. É uma das tristezas que o bobo não prevê. César terminou dizendo a célebre frase: "Até tu, Brutus?"

Bobo não reclama. Em compensação, como exclama!

Os bobos, com todas as suas palhaçadas, devem estar todos no céu. Se Cristo tivesse sido esperto não teria morrido na cruz.

O bobo é sempre tão simpático que há espertos que se fazem passar por bobos. Ser bobo é uma criatividade e, como toda criação, é difícil. Por isso é que os espertos não conseguem passar por bobos. Os espertos ganham dos outros. Em compensação os bobos ganham a vida. Bem-aventurados os bobos porque sabem sem que ninguém desconfie. Aliás não se importam que saibam que eles sabem.

Há lugares que facilitam mais as pessoas serem bobas (não confundir bobo com burro, com tolo, com fútil). Minas Gerais, por exemplo, facilita ser bobo. Ah, quantos perdem por não nascer em Minas!

Bobo é Chagall, que põe vaca no espaço, voando por cima das casas. É quase impossível evitar excesso de amor que o bobo provoca. É que só o bobo é capaz de excesso de amor. E só o amor faz o bobo.

Texto de Clarisse Lispector. 

7 de junho de 2017

História de Soror Mariana Alcoforado



Eu queria falar inicialmente sobre cartas de amor de homens notáveis, porém não achei nenhum PDF disponível pra compra, terei que procurar mais, então decido falar sobre Mariana Alcoforado. Conhece? Eu também não conhecia, mas desde que li a história dela, no livro de Mirian Cyr, me apaixonei pela história e por Mariana. Eu fui à biblioteca, certa feita de 2013, com o intuito de achar um livro que  falasse sobre amor, pois eu queria escrever no blog, sobre amor,mas embasando com algum livro bacana. Chegando lá, a mocinha que fica por conta da consultoria tinha faltado. Mas a sessaõ estava aberta pra quem quisesse alugar um livro de sua escolha. E eu fui olhando sem muita esperança pelas prateleiras, por que eram mais de 10, e achei esse livro: "A maior paixão do mundo- A história da freira Mariana Alcoforado e suas cartas de amor proibido-por Myriam Cyr". O título sugere o romance e a tragédia. Não exitei em pegar o livro pra alugar, afinal, histórias de amor de freiras, não são muito comuns, não é mesmo?

Eu comecei a ler o livro, bem devagar, degustando a história, mas quando percebi, estava virando a madrugada com ele e até hoje, eu ainda sinto o impacto que ele teve na minha vida, as palavras de amor desesperadas de uma Mariana, fizeram com que eu virasse uma página pessoal, e mais, cheguei à conclusão que todas nós mulheres um dia também fomos Mariana Alcoforado, mesmo que por 5 minutos.

Um breve sobre Mariana: Ela era freira, se apaixonou por um Marquês, soldado e francês, que por motivos políticos teve que abandoná- la sem explicações. Mariana louca de amor lhe escreve 5 cartas em 5 momentos declarando um milhão de coisas apaixonadas, magoadas, feridas. Acontece que me vi em Mariana, vi suas palavras de mais de 100 anos ecoando em mim, no que sinto, no que vivi. E vi minha visão sobre o amor mudar tanto que as pessoas a minha volta perceberam que alguma coisa borbulhava dentro de mim.

Mariana Mendes da Costa Alcoforado ou Mariana Vaz Alcoforado O.S.C. (Beja, Santa Maria da Feira, 22 de abril de 1640 — Beja, 28 de julho de 1723) foi uma freira portuguesa do Convento de Nossa Senhora da Conceição em Beja.

Mariana foi uma freira portguesa que enfrentou os tabus da sua época, ela teve sua vocação traçada por mera vontade paterna, de que ela se tonasse freira no Convento da Conceição em Portugal, mesmo sem qualquer vocação religiosa, e isso era normal na época, muitos jovens, tanto homens como mulheres passavam por isso. O livro conta que certo dia, o exército desfilava pelo terraço do convento, enquanto Mariana assistia, seu coração avistou Chamilly, um Marquês. A paixão dos dois, no entanto, não se restringiu a bilhetes ou flêrtes ingênuos, a paixão entre eles foi carnal e consumadora de desejos. os boatos não demoraram a correr pelo convento, e não demoraram também a correr fora dele, aí a história se bifurca, uns cogitam que Chamilly com medo, optou por fugir de Portugal e retornar para França, alegando que seu irmão estava doente, outros cogitam que ele se ausentou por obrigações políticas e que outras adversidades o impediram de retornar. O fato é que ele havia saído de Portugal, deixando com Mariana a promessa de que enviaria alguém para busca-la e leva-la pra junto dele na França, fato que nunca ocorreu. As 5 cartas que ela escreveu, surgiram durante essa espera, e Chamilly respondeu apenas uma carta, e de maneira tão formal, como se nunca a tivesse conhecido profundamente. As cartas, não se sabe como, e por isso cogitam sua autenticidade, começaram a circular por Paris, em 1669,  na época, era comum que livros fossem publicados como "autor desconhecido", até mesmo pra promover a venda do que era escrito, por se tratar de uma época em que impressos eram raros, o mundo estava apenas em sua segunda fase da impressão de livros. Por terem sido espalhadas as cartas da forma que foram, muitos escritores famosos da época, duvidaram que os escritos derivavam de uma mulher, mas isso não é novidade pra época. O que os dados históricos não mostram, é que Mariana nunca viu o amor romântico além do amor que Chamilly lhe dedicou por curto período, Mariana arriscou perder sua reputação e sua sanidade por um homem que a deixou, no entanto, ela lutou resoluta por esse amor impossível, ela acreditava que Chamilly retornaria, e repararia a indiscrição dos atos de ambos com um casamento. Com o tempo, Mariana se deu conta que a maior paixão, não era por Chamilly, mas pelo próprio amor. Mariana amou o amor, ela descobriu que não importava o que pudesse acontecer, ela lamentava por Chamilly tê- la abandonado, mas preferia mil vezes sofrer por amor, por ter sentido e por sentir amor, do que nunca ter descoberto as doçuras do próprio. Não se sabe o que Chamilly pensava, ele escreveu apenas uma carta irrisória para Mariana, carta que ela disse que preferia jamais ter recebido. Se ele a amou além da cama onde foram amantes, jamais saberemos, se ele pensou nela em cada minuto da sua vida ou se ele se preocupou alguma vez que os boatos sobre o romance a pudessem arruinar, isso não saberemos nunca, mas vou fazer das palavras finais da autora as minhas próprias:


"Aqueles que a enterraram não sabiam que, por mais que tentassem fazer com que Mariana desaparecesse, suas palavras sobreviveriam à difamação, à especulação, ao anonimato e à controvérsia. Continuam a transmitir uma dor que ecoa em todas aquelas que esperam em vão pelo retorno de um amado. Suas cartas mostram que podemos até chegar às estrelas, mas, nas questões do coração, nada muda." Myriam Cyr


As cartas valem ser lidas, estão nos posts anteriores, transcritas por ordem, valem ser lidas por inteiro, engolidas pela alma de que as lê, vele serem absorvidas pelo coração, servem de consolo, alento, alerta, mudam as pessoas. A mim ensinou a ser responsável pelo que cativo nos outros, ter fidelidade com as minhas palavras e ações, me ensinou a grandeza e a humanidade de um coração que pode tomar decisões e ser responsável por essas decisões. 

Mariana, passou toda sua vida naquele mesmo convento, chegou a patente máxima de abadessa, e faleceu em 1723, de Chamilly, nunca mais teve notícias. 

6 de junho de 2017

Semana do Amor - 5 Cartas de Amor, em 5 dias - Cartas Portuguesas, Soror Mariana Alcoforado 5 de 5



QUINTA CARTA

Fonte: http://arlindo-correia.com/101205.html



Escrevo-lhe pela última vez e espero fazer-lhe sentir, na diferença de termos e modos desta carta, que finalmente acabou por me convencer de que já me não ama e que devo, portanto, deixar de o amar.

Mandar-lhe-ei, pelo primeiro meio, o que me resta ainda de si. Não receie que lhe volte a escrever, pois nem sequer porei o seu nome na encomenda. De tudo isso encarreguei D. Brites, que eu habituara a confidências bem diferentes. Os seus cuidados não me serão tão suspeitos quanto os meus. Ela tomará as precauções necessárias para que eu fique com a certeza de que recebeu o retrato e as pulseiras que me deu. Quero porém dizer-lhe que me encontro, há já alguns dias, na disposição de me desfazer e queimar essas lembranças do seu amor, que tão preciosas me foram. Mas tanta franqueza lhe tenho mostrado que nunca acreditaria que eu fosse capaz de chegar a tal extremo. Quero sentir até ao fim a pena que tenho em separar-me delas e causar-lhe ao menos algum despeito.

Confesso-lhe, para vergonha minha e sua, que me encontrei mais presa do que quero dizer-lhe a estas futilidades, e senti outra vez necessidade de toda a minha reflexão para me separar de cada uma em particular, e isto quando já me gabava de me ter desprendido de si. Mas, com tantos motivos, consegue-se sempre o que se deseja. Pus tudo nas mãos de D. Brites. Quantas lágrimas me não custou esta resolução! Depois de mil impulsos e mil hesitações, que nem pode imaginar, e de que certamente não lhe darei conta, roguei-lhe para me não voltar a falar nelas, nem mas restituir ainda que lhas pedisse só para as ver uma vez mais e, por fim, remeter-lhas sem me prevenir.

Não conheci o desvario do meu amor senão quando me esforcei de todas as maneiras para me curar dele, e receio que nem ousasse tentá-lo se pudesse prever tanta dificuldade e tanta violência. Creio que me teria sido menos doloroso continuar a amá-lo, apesar da sua ingratidão, do que deixá-lo para sempre. Descobri que lhe queria menos do que à minha paixão, e sofri penosamente em combatê-la, depois que o seu indigno procedimento me tornou odioso todo o seu ser. O orgulho tão próprio das mulheres não me ajudou a tomar qualquer decisão contra si. Ai, suportei o seu desprezo, e teria suportado o ódio e o ciúme que me provocasse a sua inclinação por outra! Ao menos, teria qualquer paixão a combater. Mas a sua indiferença é intolerável. Os impertinentes protestos de amizade e a ridícula correcção da sua última carta provaram-me ter recebido todas as que lhe escrevi e que, apesar de as ter lido, não perturbaram o seu coração. Ingrato! E a minha loucura é tanta ainda, que desespero por já não poder iludir-me com a ideia de não chegarem aí, ou de não lhe terem sido entregues.

Detesto a sua franqueza. Pedi-lhe eu para me dizer pura e simplesmente a verdade? Porque me não deixou com a minha paixão? Bastava não me ter escrito: eu não procurava ser esclarecida. Não me chegava a desgraça de não ter conseguido de si o cuidado de me iludir? Era preciso não lhe poder perdoar? Saiba que acabei por ver quanto é indigno dos meus sentimentos; conheço agora todas as suas detestáveis qualidades. Mas, se tudo quanto fiz por si pode merecer-lhe qualquer pequena atenção para algum favor que lhe peça, suplico-lhe que não me escreva mais e me ajude a esquecê-lo completamente. Se me mostrasse, ao de leve que fosse, ter sentido algum desgosto ao ler esta carta, talvez eu acreditasse; talvez a sua confissão e o seu arrependimento me enchessem de cólera e de despeito; e tudo isso poderia de novo incendiar-me.

Não se meta pois no meu caminho; destruiria, sem dúvida, todos os meus projectos, fosse qual fosse a maneira por que se intrometesse. Não me interessa saber o resultado desta carta; não perturbe o estado para que me estou preparando. Parece-me que pode estar satisfeito com o mal que me causa, qualquer que fosse a sua intenção de me desgraçar. Não me tire desta incerteza; com o tempo espero fazer dela qualquer coisa parecida com a tranquilidade. Prometo-lhe não o ficar a odiar: por de mais desconfio de sentimentos de sentimentos exaltados para me permitir intentá-lo.

Estou convencida de que talvez encontrasse aqui um amante melhor e mais fiel; mas ai!, quem me poderá ter amor? Conseguirá a paixão de outro homem absorver-me? Que poder teve a minha sobre si? Não sei eu por experiência que um coração enternecido nunca mais esquece quem lhe revelou prazeres que não conhecia, e de que era susceptível?, que todos os seus impulsos estão ligados ao ídolo que criou? que os seus primeiros pensamentos e primeiras feridas não podem curar-se nem apagar-se?, que todas as paixões que se oferecem como auxílio, e se esforçam por o encher e apaziguar, lhe prometem em vão um sentimento que não voltará a encontrar? , que todas as distracções que procura, sem nenhuma vontade de as encontrar, apenas servem para o convencer que nada ama tanto como a lembrança do seu sofrimento? Porque me deu a conhecer a imperfeição e o desencanto de uma afeição que não deve durar eternamente, e a amargura que acompanha um amor violento, quando não é correspondido? E por que razão, uma cega inclinação e um cruel destino, persistem quase sempre em prender-nos àqueles que só a outros são sensíveis?

Mesmo que esperasse distrair-me com nova afeição, e deparasse com alguém capaz de lealdade, é tal a pena que sinto por mim que teria muitos escrúpulos em arrastar o último dos homens ao estado a que me reduziu. E embora me não mereça já nenhum respeito, não poderia decidir-me a tão cruel vingança, mesmo se, por uma mudança que não vislumbro, isso viesse a depender de mim.

Procuro neste momento desculpá-lo, e sei bem que uma freira raramente inspira amor; no entanto parece-me que, se a razão fosse usada na escolha, deveriam preferir-se às outras mulheres: nada as impede de pensar constantemente na sua paixão, nem são desviadas por mil coisas com que as outras se distraem e ocupam. Creio que não deve ser muito agradável ver aquelas a quem amamos sempre distraídas com futilidades; e é preciso ter bem pouca delicadeza para suportar, sem desespero, ouvi-las só falar de reuniões, atavios e passeios. Continuamente se está exposto a novos ciúmes, pois elas são obrigadas a certas atenções, certas condescendências, certas conversas. Quem pode garantir que em tais ocasiões se não divirtam, e que suportem os maridos somente com extremo desgosto, e sem qualquer aprovação? Como elas devem desconfiar de um amante que lhes não peça contas rigorosas de tudo isso, que acredite facilmente e sem inquietação no que lhe dizem, e as veja, confiante e tranquilo, sujeitas a todas essas obrigações!

Mas não pretendo provar-lhe com boas razões que me devia amar. Fracos meios seriam estes, e eu outros usei bem melhores sem nenhum resultado. Conheço de sobra o meu destino para tentar mudá-lo. Hei-de ser toda a vida uma desgraçada! Não o era já quando o via todos os dias? Morria de medo que me não fosse fiel; queria vê-lo a cada momento e isso não era possível; inquietava-me com o perigo que corria ao entrar neste convento; não vivia quando estava em campanha; desesperava-me por não ser mais bonita e mais digna de si; lamentava a mediocridade da minha condição; pensava nos prejuízos que lhe podia acarretar a afeição que parecia ter por mim; imaginava que não o amava bastante; receava, por si, a cólera de minha família; enfim, encontrava-me num estado tão lamentável como aquele em que estou agora.

Se me tivesse dado alguma prova de amor, depois de ter saído de Portugal, teria feito todos os esforços para sair daqui; ter-me-ia disfarçado para ir ter consigo. Ai, que teria sido de mim se não se importasse comigo, depois de estar em França? Que horror! Que loucura! Que vergonha tão grande para a minha família, a quem quero tanto, depois que deixei de o amar!

A sangue-frio, como vê, reconheço que podia ainda ser mais digna de piedade do que sou. Ao menos uma vez na vida falo lhe ponderadamente. Quanto lhe agradará a minha moderação, e como ficará satisfeito comigo! Mas não quero sabê-lo! Já lhe pedi, e volto a suplicar-lho para não me escrever mais.

Nunca reflectiu na maneira como me tem tratado? Nunca pensou que me deve mais obrigações do que a qualquer outra pessoa? Amei-o como uma louca, tudo desprezei! O seu procedimento não é de um homem de bem. É preciso que tivesse por mim uma aversão natural para me não ter amado apaixonadamente. Deixei-me fascinar por qualidades bem medíocres. Que fez para me agradar? Que sacrifícios fez por mim? Não procurou tantos outros prazeres? Renunciou ao jogo e à caça? Não foi o primeiro a partir para campanha? Não foi o último a regressar? Expôs-se loucamente, apesar de tanto lhe haver pedido que se poupasse por amor de mim. Nunca procurou um meio de se fixar em Portugal, onde era estimado. Uma carta de seu irmão bastou para o fazer abalar, sem a menor hesitação. E não vim eu saber que, durante a viagem, a sua disposição era a melhor do mundo?

Forçoso me é confessar que tenho razões para o odiar mortalmente. Ah, eu própria atraí sobre mim tanta desgraça! Acostumei-o desde início, ingenuamente, a uma grande paixão, e é necessário algum artifício para nos fazermos amar. Devem procurar-se com habilidade os meios de agradar: o amor por si só não suscita amor. Como pretendia que eu o amasse, e como havia formado tal desígnio, não houve nada que não tivesse feito para o atingir; ter-se-ia decidido mesmo a amar-me, se tal fosse preciso. Mas percebeu que o amor não era necessário para o êxito do seu empreendimento, nem dele precisava para nada. Que perfídia! Pensa poder enganar-me impunemente? Se por acaso voltar a este país, declaro-lhe que o entregarei à vingança da minha família.

Muito tempo vivi num abandono e numa idolatria que me horrorizam, e o remorso persegue-me com uma crueldade insuportável. Sinto uma vergonha enorme dos crimes que me levou a cometer; já não tenho pobre de mim!, a paixão que me impedia de conhecer-lhes a monstruosidade. Quando deixará o meu coração de ser dilacerado? Quando é que me livrarei desta cruel perturbação? Apesar de tudo, creio que não lhe desejo nenhum mal, e talvez me não importasse que fosse feliz. Mas como poderá sê-lo, se tiver coração?

Quero escrever-lhe ainda outra carta para lhe mostrar que daqui a algum tempo, talvez já tenha mais serenidade. Com que satisfação lhe censurarei então o seu injusto procedimento, quando este já não me importunar; lhe farei sentir que o desprezo; que falo da sua traição com a maior indiferença; que esqueci alegrias e penas; e só me lembro de si quando me quero lembrar!

Concordo que tem sobre mim muitas vantagens, e que me inspirou uma paixão que me fez perder a razão; mas não deve envaidecer-se com isso. Eu era nova, ingénua; haviam-me encerrado neste convento desde pequena; não tinha visto senão gente desagradável; nunca ouvira as belas coisas que constantemente me dizia; parecia-me que só a si devia o encanto e a beleza que descobrira em mim, e na qual me fez reparar; só ouvia dizer bem de si; toda a gente me dispunha a seu favor; e ainda fazia tudo para despertar o meu amor… Mas, por fim, livrei-me do encantamento. Grande foi a ajuda que me deu, e de que tinha, confesso, extrema necessidade.

Ao devolver-lhe as suas cartas, guardarei, cuidadosamente, as duas últimas que me escreveu ; hei-de lê-las ainda mais do que li as primeiras, para não voltar a cair nas minhas fraquezas. Ah, quanto me custam e como teria sido feliz se tivesse consentido que o amasse sempre! Reconheço que me preocupo ainda muito com as minhas queixas e a sua infidelidade, mas lembre-se que a mim própria prometi um estado mais tranquilo, que espero atingir, eu então tomarei uma resolução extrema, que virá a conhecer sem grande desgosto. De si nada mais quero. Sou uma doida, passo o tempo a dizer a mesma coisa. É preciso deixá-lo e não pensar mais em si. Creio mesmo que não voltarei a escrever-lhe. Que obrigação tenho eu de lhe dar conta de todos os meus sentimentos?

De: Cartas Portuguesas atribuídas a Mariana Alcoforado, traduzidas por Eugénio de Andrade (pseudón.), Edição bilingue, RTP, Março de 1980, 80 págs.

5 de junho de 2017

Semana do Amor - 5 Cartas de Amor, em 5 dias - Cartas Portuguesas, Soror Mariana Alcoforado 4 de 5



QUARTA CARTA

Fonte: http://arlindo-correia.com/101205.html


O teu tenente acaba de me contar que um temporal te obrigou a arribar ao Reino do Algarve. Receio que tenhas sofrido muito no mar, e este temor de tal modo se apoderou de mim, que nem tenho pensado nas minhas mágoas. Estás convencido que o teu tenente se preocupa mais com o que te acontece do que eu? Porque está então mais bem informado e, enfim, porque não me tens escrito?

Bem desgraçada sou, se depois da tua partida ainda não tiveste ocasião de o fazer; e mais ainda, se a tiveste e não me escreveste. Não sei de maior ingratidão e injustiça; mas ficaria aflitíssima se, por causa disso, te viesse a acontecer qualquer desgraça, pois prefiro não ser vingada a que sejas punido. Resisto a tudo o que parece mostrar-me que já me não amas, e com mais facilidade me entrego cegamente à minha paixão do que às razões que tenho para lamentar o teu abandono.

Quanta inquietação me terias poupado se, quando nos conhecemos, o teu procedimento fosse tão descuidado como o é agora! Mas quem, como eu, se não deixaria enganar por tantos cuidados , e a quem não pareceriam verdadeiros? Que difícil resolvermo-nos a duvidar da lealdade de quem amamos! Sei muito bem que te serves de qualquer desculpa, mas, mesmo sem pensares em dar-ma, o meu amor é tão fiel que só consente em culpar-te para ser maior o prazer em te justificar.

Atormentaste-me com a tua insistência, transtornaste-me com o teu ardor, encantaste-me com a tua delicadeza, confiei nas tuas juras, seduziu-me a minha inclinação violenta, e o que se seguiu a tão agradável e feliz começo não são mais que suspiros, lágrimas e uma tristíssima morte que julgo sem remédio. E certo que tive, ao amar-te, alegrias surpreendentes, mas custam-me agora os maiores tormentos: são extremas todas as emoções que me causas. Se tivesse resistido com afinco ao teu amor, se te houvesse dados motivos de desgosto ou de ciúme para mais te prender, se tivesses notado em mim qualquer intencional reserva, se, enfim, tivesse tentado opor (embora, sem duvida, fossem inúteis tais esforços) a razão à natural inclinação que tenho por ti, e que cedo me fizeste notar, poderias então punir-me severamente e servires-te do teu domínio sobre mim; porém antes de dizeres que me querias já eu te julgava digno de amor, manifestaste-me a tua paixão, fiquei deslumbrada, e abandonei-me a ti perdidamente.

Tu não estavas cego como eu, porque me deixaste então chegar ao estado a que cheguei? Que querias dum desvario que não podia senão importunar-te? Se sabias que não ficavas em Portugal, porque me escolheste a mim para tornares tão desgraçada? Terias, certamente encontrado neste país uma mulher mais bonita com quem tivesses os mesmos prazeres, pois só os de natureza grosseira procuravas; que te amasse fielmente enquanto aqui estivesses; que se resignasse, com o tempo, à tua ausência, e a quem poderias abandonar sem perfídia e crueldade. O teu procedimento é mais de um tirano empenhado em perseguir, que de um amante preocupado apenas em agradar. Ai!, porque tratas tão mal um coração que é teu?

Bem sei que é tão fácil para ti desprenderes-te de mim como para mim o foi prender-me a ti. Eu teria resistido a razões bem mais poderosas do que as que te levaram a partir, sem precisar de invocar o meu amor por ti, nem me passar pela cabeça que fazia fosse o que fosse de extraordinário: todas elas me pareceriam insignificantes e nunca nenhuma poderia arrancar-me de ao pé de ti. Mas tu quiseste aproveitar os pretextos que encontraste para regressar a França. Um navio partia - porque não o deixaste partir? Tua família havia-te escrito - não sabias quanto a minha me tem perseguido? Razões de honra levavam-te a abandonar-me - fiz eu algum caso da minha? Tinhas obrigação de servir o teu Rei - mas, se é verdade o que dizem dele, não necessitava dos teus serviços e ter-te-ia dispensado.

Que felicidade a minha, se tivéssemos passado a vida juntos! Mas, se era forçoso que uma cruel ausência nos separasse, creio que devo estar satisfeita por não ter sido infiel, e por nada do mundo quereria ter cometido acção tão indigna. Como pudeste, conhecendo o meu coração e a minha ternura até ao fundo, decidir-te a deixar-me para sempre, e a expor-me ao tormento de que só venhas a lembrar te de mim quando me sacrificas a nova paixão?

Bem sei que te amo perdidamente; no entanto, não lamento a violência dos impulsos do meu coração; habituei-me à sua tirania, e já não poderia viver sem este prazer que vou descobrindo: amar-te entre tanta mágoa. O que me desgosta e atormenta é o ódio e a aversão que ganhei a tudo. A família, os amigos e este convento são-me insuportáveis. Tudo o que seja obrigada a ver, tudo o que inadiavelmente tenha de fazer, me é odioso. Tão ciosa sou da minha paixão que julgo dizerem-te respeito todas as minhas acções e todas as minhas obrigações. Sim, tenho escrúpulo de não serem para ti todos os momentos da minha vida. Ai!, que seria de mim sem tanto ódio e tanto amor a encher-me o coração? Conseguiria eu sobreviver ao que obsessivamente me preocupa para levar uma existência tranquila e sem cuidados? Tal vazio e tal insensibilidade não me convêm.

Toda a gente se apercebeu da completa mudança do meu carácter, dos meus modos, do meu ser. Minha mãe falou-me nisto, primeiro com azedume, depois com certa brandura. Nem sei que lhe respondi; parece-me que lhe confessei tudo. Até as freiras mais austeras têm dó do estado em que me encontro, que lhes merece alguma simpatia, e até cuidado. Todos se comovem com o meu amor, só tu ficas profundamente indiferente, escrevendo-me apenas frias cartas, cheias de repetições, metade do papel em branco, dando grosseiramente a entender que estavas morto por acabá-las.

Dona Brites insistiu, nestes últimos dias, para que saísse do meu quarto; julgando distrair-me, levou-me a passear até ao balcão de onde se avista Mértola. Segui-a, mas fui logo ferida por tão atroz lembrança que passei o resto do dia lavada em lágrimas. Trouxe-me outra vez para o meu quarto, atirei-me para cima da cama, e ali fiquei a reflectir na pouca esperança que tenho de vir um dia a curar me. Tudo o que fazem para me confortar agrava o meu sofrimento, e nos próprios remédios encontro novas razões de aflição. Muitas vezes dali te vi passar com um ar que me deslumbrava; estava naquele balcão no dia fatal em que senti os primeiros sinais da minha desgraçada paixão. Pareceu-me que pretendias agradar-me, embora não me conhecesses; convenci-me de que me havias distinguido entre todas aquelas que estavam comigo; quando paravas imaginava que o fazias intencionalmente para que melhor te visse, e admirasse o garbo e a destreza com que dominavas o cavalo; dava comigo assustada, quando o levavas por sítios perigosos; enfim, interessava-me secretamente por todas as tuas acções, sentia já que não eras de modo nenhum indiferente, e reclamava para mim tudo quanto fazias. Conheces de sobra o que se seguiu a tal começo; e, embora não tenha obrigação de te poupar, não devo falar-te nisso, com receio de te tornar ainda mais culpado, se possível, do que já és, e ter de me acusar por tantos e inúteis esforços que te obrigassem a ser-me fiel. Nunca o serás! Se não conseguir vencer a tua ingratidão à força de amor e renúncia, como haveria de consegui-lo com cartas e queixumes?

Estou mais que convencida do meu infortúnio; a injustiça do teu procedimento não me deixa a menor dúvida, e tudo devo recear, já que me abandonaste.

Serei só eu a sentir o teu encanto? Nenhuns outros olhos darão por ele? Creio que me não seria desagradável se, de algum modo, os sentimentos de outras justificassem os meus, e gostaria que todas as mulheres de França te achassem encantador, mas que nenhuma te amasse e nenhuma te agradasse. Este desejo é inconcebível e ridículo; sei por experiência que és incapaz de fidelidade e não precisas de ajuda para me esqueceres, nem a isso seres levado por nova paixão. Desejaria eu que tivesses um motivo razoável? Seria mais desgraçada, é certo, mas não serias tão culpado.

Vejo que ficarás em França sem grande prazer, e com inteira liberdade. Será a fadiga de tão longa viagem, qualquer pequena conveniência, ou o receio de não corresponderes à minha exaltação que aí te retêm? De mim, nada receies! Bastar-me-ia ver-te de vez em quando e saber apenas que estávamos no mesmo lugar. E talvez me iluda; sei lá se não serás mais sensível à crueldade e à frieza de outra mulher do que foste à minha generosidade. Será possível que gostes de quem te faça mal? Mas antes de te enleares numa grande paixão, reflecte bem no horror do meu sofrimento, na incerteza dos meus planos, na contradição dos meus impulsos, na extravagância das minhas cartas, na minha confiança, e aflição, e desejos, e ciúmes. Ah, serás um desgraçado! Suplico-te que tires ao menos proveito do estado em que me encontro, e que assim o meu sofrimento não seja inútil.

Haverá cinco ou seis meses, fizeste-me uma confidência bem desagradável: confessaste-me, com a maior franqueza, teres amado uma mulher na tua terra; se é ela que te impede de regressar, manda-mo dizer sem rodeios, para que eu deixe de me consumir. Um resto de esperança tem-me ainda de pé, mas, se a não puder sustentar, prefiro perdê-la por completo e perder-me também. Envia-me o retrato dela e alguma das suas cartas e conta-me tudo quanto te diz. Talvez encontre nisso razões para me consolar, ou afligir ainda mais. Neste estado é que não posso permanecer, e qualquer mudança me será favorável. Gostaria também de ter o retrato do teu irmão e da tua cunhada. Tudo o que te diz respeito me enternece, a minha dedicação ao que te pertence é completa; só o que a mim se refere não me preocupa. Às vezes parece-me que até me sujeitaria a servir aquela que amas. O tormento que me causas e o teu desprezo abalaram-me de tal modo, que nem sequer ouso pensar que pudesse vir a ter ciúmes de ti, com receio de te desagradar; e creio ter feito o pior que podia fazer ao atrever-me a censurar-te. Também estou convencida de que não devia impor-te desvairadamente como faço, por vezes, um sentimento que não aprovas.

Há já muito tempo que um oficial espera esta carta. Tencionava escrevê-la de forma a não te aborrecer, mas é tão incoerente que será melhor acabá-la. Ai, não está em mim poder fazê-lo! Quando te escrevo é como se falasse contigo e estivesses, de algum modo, mais perto de mim. A próxima não será tão longa nem tão importuna; podes abri-la e lê-la, confiado na minha promessa. Na verdade não devo falar-te de uma paixão que te desagrada, e não voltarei a falar nela.

Vai fazer um ano, faltam só alguns dias, que me entreguei inteiramente a ti. A tua paixão parecia-me tão sincera e ardente, que não poderia imaginar sequer que a minha te viesse a aborrecer, a ponto de te obrigar a fazer quinhentas léguas, e a expores-te a naufrágios, para te afastares de mim. Não esperava ser tratada assim por ninguém: devias lembrar-te do meu pudor, da minha confusão, da minha vergonha, mas tu não te lembras de nada que possa levar-te contra vontade a amar-me.

O oficial que há-de levar esta carta previne-me, pela quarta vez, que quer partir. Como ele tem pressa! Abandona, com certeza, alguma desgraçada neste pais. Adeus. Custa-me mais acabar esta carta d que te custou a ti deixa-me, talvez para sempre. Adeus. Não me atrevo sequer a chamar-te meu amor, nem a abandonar-me completamente a tudo o que sinto. Quero-te mil vezes mais que à minha vida e mil vezes mais do que imagino. Ah, corno eu te amo, e como tu és cruel! Nunca me escreves; não consigo) deixar de te dizer ainda isto. Recomeço, e oficial partirá. Se partir, que importa? Escrevo mais para mim do que para ti; não procuro senão alívio. O tamanho desta carta vai assustar-te: não a lerás. Que fiz eu para ser tão desgraçada? Porque envenenaste a minha vida? Porque não nasci noutro país? Adeus. Perdoa-me. Já não ouso pedir-te que me queiras. Vê ao que me reduziu o meu destino. Adeus.

4 de junho de 2017

Semana do Amor - 5 Cartas de Amor, em 5 dias - Cartas Portuguesas, Soror Mariana Alcoforado 3 de 5



TERCEIRA CARTA

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Que há-de ser de mim? Que queres tu que eu faça? Estou tão longe de tudo quanto imaginei! Esperava que me escrevesses de toda a parte por onde passasses e que as tuas cartas fossem longas; que alimentasses a minha paixão com a esperança de voltar a ver-te; que uma inteira confiança na tua fidelidade me desse algum sossego, e ficasse, apesar de tudo, num estado suportável, sem excessivo sofrimento. Tinha até formado uns vagos projectos de fazer todos os esforços que pudesse para me curar, se tivesse a certeza de me haveres esquecido por completo. A tua ausência, alguns impulsos de devoção, o receio de arruinar inteiramente o que me resta de saúde com tanta vigília e tanta aflição, as poucas possibilidades do teu regresso, a frieza dos teus sentimentos e da tua despedida, a tua partida justificada com falsos pretextos, e tantas outras razões, tão boas como inúteis, prometiam ser-me ajuda suficiente, se viesse a precisar dela. Não sendo, afinal, senão eu própria o meu inimigo, não podia suspeitar de toda a minha fraqueza, nem prever todo o sofrimento de agora.

Ai, como sou digna de piedade por não partilhar contigo as minhas mágoas, e ser só minha a desventura! Esta ideia mata-me, e morro de terror ao) pensar que nunca te houvesses entregado completamente aos nossos prazeres. Sim, reconheço agora a falsidade do teu arrebatamento. Enganaste-me sempre que falaste do encantamento que sentias quando eslavas a sós comigo. Unicamente à minha insistência devo os teus cuidados e a tua ternura. Intentaste desvairar-me a sangue-frio; nunca olhaste a minha paixão senão como um troféu, o teu coração não foi verdadeiramente atingido por ela. Serás tão infeliz, e terás tão pouca delicadeza, que só para isso te servisse o meu ardor? E como é possível que, com tanto amor, não te houvesse feito inteiramente feliz? Tenho pena, por amor de ti apenas, dos infinitos prazeres que perdeste. Será possível que não te tenham interessado? Ah, se os conhecesses, perceberias, sem dúvida, que são mais delicados do que o de me haveres seduzido, e terias compreendido que é bem mais comovente, e bem melhor, amar violentamente que ser amado.

Não sei o que sou, nem o que faço, nem o que quero; estou despedaçada por mil sentimentos contrários. Pode imaginar-se estado mais deplorável? Amo-te de tal maneira que nem ouso sequer desejar que venhas a ser perturbado por igual arrebatamento. Matar-me-ia ou, se o não fizesse, morreria desesperada, se viesse a ter a certeza que nunca mais tinhas descanso, que tudo te era odioso, e a tua vida não era mais que perturbação, desespero e pranto. Se não consigo já suportar o meu próprio mal, como poderia ainda com o teu, a que sou mil vezes mais sensível? Contudo, não me resolvo a desejar que não penses em mim; e confesso ter ciúmes terríveis de tudo o que em França te dá gosto e alegria, e impressiona o teu coração.

Não sei porque te escrevo: terás, quando muito, piedade de mim, e eu não quero a tua piedade. Contra mim própria me indigno, quando penso em tudo o que te sacrifiquei: perdi a reputação, expus-me à cólera de minha família, expus-me à cólera de minha família, a severidade das leis deste país para com as freiras, e à tua ingratidão, que me parece o maior de todos os males. Apesar disso, creio que os meus remorsos não são verdadeiros; do fundo do meu coração queria ter corrido ainda perigos maiores pelo teu amor, e sinto um prazer fatal por ter arriscado a vida e a honra por ti. Não deveria oferecer-te o que tenho de mais precioso? E não devo sentir-me satisfeita por ter feito o que fiz? O que me não satisfaz, pelo menos assim me parece, é o sofrimento e o desvario deste amor, embora não possa, pobre de mim!, iludir-me a ponto de estar contente contigo. Vivo - que infidelidade! - e faço tanto por conservar a vida como por perdê-la! Morro de vergonha! Então o meu desespero está só nas minhas cartas? Se te amasse tanto como já mil vezes te disse, não teria morrido há muito tempo? Enganei-te, és tu que deves queixar-te de mim. Ah, porque não te queixas? Vi-te partir, não tenho esperança de te ver regressar e no entanto respiro. Atraiçoei-te; peço-te perdão. Mas não, não me perdoes! Trata—me com dureza. Que a violência dos meus sentimentos te não baste! Sê mais exigente!

Ordena-me que morra de amor por ti! Suplico-te que me ajudes a vencer a fraqueza própria de uma mulher, e que toda a minha indecisão acabe em puro desespero. Um fim trágico obrigar-te-ia, sem dúvida, a pensar mais em mim; talvez fosses sensível a uma morte extraordinária, e a minha memória seria amada. Não é isso preferível ao estado a que me reduziste?

Adeus. Era melhor nunca te ter visto. Ah, sinto até ao fundo a mentira deste pensamento e reconheço, no momento em que escrevo, que prefiro ser desgraçada amando-te do que nunca te haver conhecido. Aceito, assim, sem uma queixa, a minha má fortuna, pois não a quiseste tornar melhor. Adeus: promete-me que terás saudades minhas se vier a morrer de tristeza; e oxalá o desvario desta paixão consiga afastar-te de tudo. Tal consolação me bastará, e se é forçoso abandonar-te para sempre, queria ao menos não te deixar a nenhuma outra. E serias tão cruel que te servisses do meu desespero para te tornares mais sedutor, e te gabares de ter despertado a maior paixão do mundo? Adeus, mais urna vez. Escrevo-te cartas tão longas! Não tenho cuidado contigo! Peço-te que me perdoes, e espero que terás ainda alguma indulgência com uma pobre insensata, que o não era, como sabes, antes de te amar. Adeus; parece-me que te falo de mais do estado insuportável em que me encontro; mas agradeço-te, com toda a minha alma, o desespero que me causas, e odeio a tranquilidade em que vivi antes de te conhecer Adeus. O meu amor aumenta a cada momento. Ah, quanto me fica ainda por dizer..

3 de junho de 2017

Semana do Amor - 5 Cartas de Amor, em 5 dias - Cartas Portuguesas, Soror Mariana Alcoforado 2 de 5



SEGUNDA CARTA

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Creio que faço ao meu coração a maior das afrontas aos procurar dar-te conta, por escrito, dos meus sentimentos. Seria tão feliz se os pudesse avaliar pela violência dos teus! Mas não posso confiar em ti, nem posso deixar de te dizer, embora sem a força com que o sinto, que não devias maltratar-me assim, com um esquecimento que me desvaira e chega a ser uma vergonha para ti. É justo que suportes, ao menos, as queixas de desgraças que previ ao ver-te decidido a deixar-me. Reconheço que me enganei, ao pensar que procederias com mais lealdade dos que é costume: o excessos do meu amor parece que devia pôr-me acima de quaisquer suspeitas e merecer uma fidelidade que não é vulgar encontrar-se. Mas a tua disposição para me atraiçoar triunfou, afinal, sobre a justiça que devias a tudo quanto fiz por ti. Não deixaria de ser infeliz se soubesse que só ao meu amor ganharas amor, pois tudo quisera dever unicamente à tua inclinação por mim; mas estou tão longe de tal estado que já lá vão seis meses sem receber uma única carta tua. Só à cegueira com que me abandonei a ti posso atribuir tanta desgraça: não tinha obrigação de prever que as minhas alegrias acabariam antes do meu amor? Como poderia esperar que ficasses para sempre em Portugal, renunciasses à tua carreira e ao teu país para não pensares senão em mim? Nenhum alívio há para o meu mal, e se me lembro das minhas alegrias maior é ainda o meu desespero. Terá sido então inútil todo o meu desejo, e não voltarei a ver-te no meu quarto com o ardor e arrebatamento que me mostravas?Ai, que ilusão a minha! Demasiado sei eu que todas as emoções, que em mim se apoderavam da cabeça e do coração, eram em ti despertadas unicamente por certos prazeres e, comos eles, depressa se extinguiam. Precisava, nesses deliciosos instantes, chamar a razão em meu auxílio para moderar o funesto excesso da minha felicidade e me levar a pressentir tudo quanto sofro presentemente. Mas de tal modo me entregava a ti, que era impossível pensar no que pudesse vir envenenar a minha alegria e impedir de me abandonar inteiramente às provas ardentes da tua paixão. Ao teu lado era demasiado feliz para poder imaginar que um dia te encontrarias longe de mim. E, contudo, lembro-me de te haver dito algumas vezes que farias de mim uma desgraçada; mas tais temores depressa se desvaneciam, e com alegria tos sacrificava para me entregar ao encanto, e à falsidade!, dos teus juramentos. Sei bem qual é o remédio para o meu mal, e depressa me livraria dele se deixasse de te amar. Ai, mas que remédio... Não; prefiro sofrer ainda mais do que esquecer-te. E depende isso de mim? Não posso censurar-me ter desejado um só instante deixar de te querer. És tu mais digno de piedade do que eu, pois vale mais sofrer corno sofro do que ter os fáceis prazeres que te hão-de dar em França as tuas amantes. Em nada invejo a tua indiferença: fazes-me pena. Desafio-te a que me esqueças completamente. Orgulho-me de te haver posto em estado de já não teres, sem mim, senão prazeres imperfeitos; e sou mais feliz que tu, porque tenho mais em que me ocupar.

Nomearam-me há pouco tempo porteira deste convento. Todos os que falam comigo crêem que estou doida, não sei que lhes respondo, e é preciso que as freiras sejam tão insensatas como eu para me julgarem capaz seja do que for. Ah, como eu invejo a sorte do Manuel e do Francisco! Porque não estou eu sempre ao pé de ti, como eles? Teria ido contigo e servir-te-ia certamente com mais dedicação.

Nada desejo no mundo senão ver-te. Lembra-te ao menos de mim. Bastar-me-ia que me lembrasses, mas eu nem disso tenho a certeza. Quando te via todos os dias não cingia as minhas esperanças à tua lembrança mas tens-me ensinado a submeter-me a tudo quanto te apetece.

Apesar disso, não estou arrependida de te haver adorado. Ainda bem que me seduziste. A crueldade da tua ausência, talvez eterna, em nada diminuiu a exaltação do meu amor Quero que toda a gente o saiba, não faço disso nenhum segredo; estou encantada por ter feito tudo quanto fiz por ti, contra toda a espécie de conveniências. E já que comecei, a minha honra e a minha religião hão-de consistir só em amar-te perdidamente toda a vida.

Não te digo estas coisas para te obrigar a escrever-me. Ah, nada faças contrafeito! De ti só quero o que te vier do coração, e recuso todas as provas de amor que tu próprio te possas dispensar. Com prazer te desculparei, se te for agradável não te dares ao trabalho de me escrever; sinto uma profunda disposição para te perdoar seja o que for.

Um oficial francês, caridosamente, falou-me de ti esta manhã durante mais de três horas. Disse-me que em França fora feita a paz. Se assim é, não poderias vir ver-me e levar-me para França contigo? Mas não o mereço. Faz o que quiseres: o meu amor já não depende da maneira como tu me tratares.

Desde que partiste nunca mais tive saúde, e todo o meu prazer consiste em repetir o teu nome mil vezes ao dia. Algumas freiras, que conhecem o estado deplorável a que me reduziste, falam-me de ti com frequência. Saio o menos possível deste quarto onde vieste tanta vez, e passo o tempo a olhar o teu retrato, que amo mil vezes mais que à minha vida. Sinto prazer em olhá-lo, mas também me faz sofrer, sobretudo quando penso que talvez nunca mais te veja. Por que fatalidade não hei-de voltar a ver-te? Ter-me-ás deixado para sempre? Estou desesperada, a tua pobre Mariana já não pode mais: desfalece ao terminar esta carta. Adeus, adeus, tem pena de mim!

2 de junho de 2017

Semana do Amor - 5 Cartas de Amor, em 5 dias - Cartas Portuguesas, Soror Mariana Alcoforado 1 de 5


PRIMEIRA CARTA

fonte: http://arlindo-correia.com/101205.html

Considera, meu amor, a que ponto chegou a tua imprevidência. Desgraçado!, foste enganado e enganaste-me com falsas esperanças. Uma paixão de que esperaste tanto prazer não é agora mais que desespero mortal, só comparável à crueldade da ausência que o causa. Há-de então este afastamento, para o qual a minha dor, por mais subtil que seja, não encontrou nome bastante lamentável, privar-me para sempre de me debruçar nuns olhos onde já vi tanto amor, que despertavam em mim emoções que me enchiam de alegria, que bastavam para meu contentamento e valiam, enfim, tudo quanto há? Ai!, os meus estão privados da única luz que os alumiava, só lágrimas lhes restam, e chorar é o único uso que faço deles, desde que soube que te havias decidido a um afastamento tão insuportável que me matará em pouco tempo.

Parece-me, no entanto, que até ao sofrimento, de que és a única causa, já vou tendo afeição. Mal te vi a minha vida foi tua, e chego a ter prazer em sacrificar-ta. Mil vezes ao dia os meus suspiros vão ao teu encontro, procuram-te por toda a parte e, em troca de tanto desassossego, só me trazem sinais da minha má fortuna, que cruelmente não me consente qualquer engano e me diz a todo o momento: Cessa, pobre Mariana, cessa de te mortificar em vão, e de procurar um amante que não voltarás a ver, que atravessou mares para te fugir, que está em França rodeado de prazeres, que não pensa um só instante nas tuas mágoas, que dispensa todo este arrebatamento e nem sequer sabe agradecer-to. Mas não, não me resolvo, a pensar tão mal de ti e estou por demais empenhada em te justificar. Nem quero imaginar que me esqueceste. Não sou já bem desgraçada sem o tormento de falsas suspeitas? E porque hei-de eu procurar esquecer todo o desvelo com que me manifestavas o teu amor? Tão deslumbrada fiquei com os teus cuidados, que bem ingrata seria se não te quisesse com desvario igual ao que me levava a minha paixão, quando me davas provas da tua.

Como é possível que a lembrança de momentos tão belos se tenha tornado tão cruel? E que, contra a sua natureza, sirva agora só para me torturar o coração? Ai!, a tua última carta reduziu-o a um estado bem singular: bateu de tal forma que parecia querer fugir-me para te ir procurar. Fiquei tão prostrada de comoção que durante mais de três horas todos os meus sentidos me abandonaram: recusava uma vida que tenho de perder por ti, já que para ti a não posso guardar. Enfim, voltei, contra vontade, a ver a luz: agradava-me sentir que morria de amor, e, além do mais, era um alívio não voltar a ser posta em frente do meu coração despedaçado pela dor da tua ausência.

Depois deste acidente tenho padecido muito, mas como poderei deixar de sofrer enquanto não te vir? Suporto contudo o meu mal sem me queixar, porque me vem de ti. É então isto que me dás em troca de tanto amor? Mas não importa, estou resolvida a adorar-te toda a vida e a não ver seja quem for, e asseguro-te que seria melhor para ti não amares mais ninguém. Poderias contentar te com uma paixão menos ardente que a minha? Talvez encontrasses mais beleza (houve um tempo, no entanto, em que me dizias que eu era muito bonita), mas não encontrarias nunca tanto amor, e tudo o mais não é nada.

Não enchas as tuas cartas de coisas inúteis, nem me voltes a pedir que me lembre de ti. Eu não te posso esquecer, e não esqueço também a esperança que me deste de vires passar algum tempo comigo. Ai!, porque não queres passar a vida inteira ao pé de mim? Se me fosse possível sair deste malfadado convento, não esperaria em Portugal pelo cumprimento da tua promessa: iria eu, sem guardar nenhuma conveniência, procurar-te, e seguir te, e amar-te em toda a parte. Não me atrevo a acreditar que isso possa acontecer; tal esperança por certo me daria algum consolo, mas não quero alimentá-la, pois só à minha dor me devo entregar. Porém, quando meu irmão me permitiu que te escrevesse, confesso que surpreendi em mim um alvoroço de alegria, que suspendeu por momentos o desespero em que vivo. Suplico-te que me digas porque teimaste em me desvairar assim, sabendo, como sabias, que terminavas por me abandonar? Porque te empenhaste tanto em me desgraçar? Porque não me deixaste em sossego no meu convento? Em que é que te ofendi? Mas perdoa-me; não te culpo de nada. Não me encontro em estado de pensar em vingança, e acuso somente o rigor do meu destino. Ao separar-nos, julgo que nos fez o mais temível dos males, embora não possa afastar o meu coração do teu; o amor, bem mais forte, uniu-os para toda a vida. E tu, se tens algum interesse por mim, escreve-me amiúde. Bem mereço o cuidado de me falares do teu coração e da tua vida; e sobretudo vem ver-me.

Adeus. Não posso separar-me deste papel que irá ter às tuas mãos. Quem me dera a mesma sorte! Ai, que loucura a minha! Sei bem que isso não é possível! Adeus; não posso mais. Adeus. Ama-me sempre, e faz-me sofrer mais ainda.


3 de maio de 2017

Porque eu sou contra a maioria das campanhas "modinha", de prevenção ao Câncer, nas mídias sociais?


E com esta foto "desabafativa", eu inicio o papo:

"- Coração na time line, hashtag secreta, foto em preto e branco, desafio aceito, etc, etc, e etc.

- Juliane, você tem câncer, você pode participar dessas campanhas?

- Não, não posso. 

- Porque?"

Tenho câncer, um linfoma de hodgkin, diagnosticado há 3 anos, já fiz 4 tratamentos incluindo um transplante, em busca da cura, estou me encaminhando pra mais um tratamento agora, que será o 5, e que será paliativo, apenas pra controle, porque o remédio que eu preciso, ainda não está disponível no hospital onde me trato pelo SUS, e a disponibilidade dele vai depender de verba e licitação, pra chegar a mim. E estas campanhas nunca me ajudaram, nem com a autoestima; porque, qual é a graça, da pessoa postar uma foto preto e branca, ela sendo saudável, pra incentivar mulheres mutiladas por câncer (eu tenho cicatrizes de catéter em 3 lugares diferentes, marcas de procedimentos com agulhas nas mãos e braços e 2 cicatrizes de biópsias que as vezes olho, e eu me sinto o Frankeinstein)? E eu não vejo a lógica, dessas campanhas quando olho pra mim mesma, aliás, não vejo nem graça, pelo contrário, acho desrespeitoso e afrontoso. O câncer, como qualquer doença grave, (que aliás eu defendo as práticas humanistas em caso de qualquer doença grave), abala a nossa autoestima de um jeito pavoroso, a gente engorda por causa de remédio, fica inchada, com cara de doente, a gente fica sem força pra executar nossas tarefas diárias, a gente as vezes precisa que nos deem banho e comida, a gente fica careca, se descaracteriza inteira até se olhar no espelho e não se ver, e outra, tudo é doloroso, não existe procedimento sem dor, quimioterapia enjoa, você vomita, fica sem comer, baixa a imunidade, tem que tomar injeções, tomar remédios pós-quimio que vão te fazer mal, vão te fazer alucinar. Desculpem, eu não vejo como uma hastag, e uma foto, possam ajudar. Ainda mais me tratando num hospital conceito no estado do Rio, que é o INCA, um hospital público de ponta, que oferece uma gama de amparos ao paciente, onde eu vejo, o que as pessoas necessitam. O hospital possui o INCA Voluntário, onde pessoas saudáveis, interessadas em ajudar (não com hastags e fotos), podem exercer atividades, de visitas, brincar com as crianças, na distribuição de cestas básicas, roupas,  sapatos e utensílios, tem gente que vai no ambulatório de quimioterapia e toca violão pra quem está se medicando. O hospital oferece uma gama de assistências, porque entende que vão chegar ali, pessoas de outros lugares, outras cidades, e essas pessoas as vezes não vão ter nem dinheiro, nem onde ficar, isso é uma realidade diária, real, latente. E com tudo isso, eu fatalmente, não posso reconhecer uma campanha "modinha", como ato de combate ao câncer.
Eu admiro muito o "Outubro Rosa", tenho que falar dessa campanha em específico, pois eles não são demagogos, são pessoas que saem nas ruas, fazem passeata, O "Outubro Rosa", (link do site, pra conhecer melhor: http://outubrorosa.org.br/objetivo/ ), surgiu do instituto Neo Mama (link do site pra conhecer melhor: http://neomama.org.br/), e eles estimulam a participação de empresas, governo, e é muito legal essa interação, porque essa é a interação correta, envolver a sociedade no combate, conscientizar o governo a mandar verba pra ter exames periódicos, pra ter aparelhos de diagnóstico. Porque o quanto mais cedo for detectado, mais rápido se cura, maiores são as chances de vida do paciente. Só que a rapidez, em muitos casos fica comprometida pela falta de estrutura dos hospitais e pela falta de verba, e aí eu pergunto novamente: Como uma foto de alguém saudável, em preto e branco, sem qualquer legenda, ajudaria? Não ajuda. Eu enxergo outras formas de representar esta causa tão importante, que citei acima; passeatas, cobrar o que se deve de governantes. A "prevenção" (combate) do Câncer de mama e de qualquer outro câncer, que na verdade se chama "combate", depende de exames periódicos, aos quais deveríamos ter direito adquirido pelo SUS e/ou na falta deles, esses exames deveriam ser providos por clínicas particulares com subsídios do governo, sabemos que não é assim, infelizmente, sabemos que não temos uma boa situação no país no que se refere á saúde pública. Agora, em relação a palavra mal empregada: "Prevenção do câncer", se é que ela existe, pode estar no estilo de vida e alimentação, porém há muitas controvérsias quanto a isso cientificamente falando, o câncer pode existir por fatores internos, hormônios, condições imunológicas, fatores externos, por produtos tóxicos ingeridos, substâncias químicas diversas, o Brasil por exemplo é campeão no uso de 14 agrotóxicos, mais tóxicos do mundo, banidos em muitos lugares onde a tecnologia e as relações humanas são bem mais respeitosas e avançadas, e aí vem a pergunta: Ao invés de usar a sua influência pra postar uma hashtag secreta, porque não usar a sua influência, combatendo as causas abertamente? Se unindo e lutando junto com uma instituição séria, pra que o país dê pra você, que também pode precisar dos serviços do SUS um dia, um atendimento digno? Porque você não sai da frente do seu computador e da tela do seu celular, e visita alguém com câncer, levando um bom papo, um sorriso, vai na ala das crianças, brinque com elas, leve brinquedos, faça uma campanha pra arrecadar cesta básica, roupa, sapato, distribua, não queime a sua mufa, tentando prevenir doenças graves postando fotos. O câncer, num ser humano, é detectável através de sintomas, checkups e biópsias.

QUANTO AO AUTO EXAME DA MAMA, (acho legal relembrar): Façamos sim! É bom, mas precisa ser sempre, SEMPRE, UMA VEZ POR SEMANA, QUANDO ESTIVER MENSTRUADA, QUANDO NÃO ESTIVER TAMBÉM, TODO DIA, que é pra você conhecer sua mama de hoje, e a mama de amanhã, e mama de daqui há um mês, assim, se acontecer algo diferente com ela, você vai saber e vai poder procurar um médico que te diagnostique.

E tem todo um script pra fazer o auto exame, em 6 passos:

1- Em frente ao espelho:
2- Posicione-se em frente ao espelho;
3- Observe os dois seios, primeiramente com os braços caídos;
4- Coloque as mãos na cintura fazendo força;
5- Coloque-as atrás da cabeça e observe o tamanho, posição e forma do mamilo;
6- Pressione levemente o mamilo e veja se há saída de secreção.

Detectou algo diferente, procure o médico!

Gaste tempo, na fila do SUS, vai demorar, nós sabemos, mas sua vida vale a pena, ou junte dinheiro durante o ano, e vá ao seu ginecologista, faça checkups, se cuide, se tiver plano de saúde, melhor ainda, não tem desculpas, cuide-se, sempre.

E como eu disse, o mais importante, não são fotos ou corações em murais, mas exames periódicos e cobrança de nós mulheres pelos nossos direitos aos nossos governantes! Esse país precisa nos reconhecer e acolher, como a mãe gentil que dizem que ele é. Quanto ás campanhas "modinha", espero ter explicado tudo com êxito e respeito. E pessoal, estou sempre aberta a cooperar, falar das minhas experiências com o câncer, ajudar nunca foi problema pra mim, o que eu não posso suportar, é que numa luta tão importante, as pessoas tratem esse assunto com fotos e hashtags, ou campanhas triviais, aí eu fico louca e a minha resposta pra isso, é:

"Não passarão",

Com muito carinho e respeitosamente,

Juliane Schimel, dona do blog Serena-West.


P.s.: DEIXO UM LINK DO INCA, PERGUNTAS E RESPOSTAS SOBRE CÂNCER, ACESSE E SAIBA MAIS:

http://www1.inca.gov.br/conteudo_view.asp?id=83

29 de março de 2017

Procura-se Colunistas Colaboradores para o Blog




Estou procurando COLUNISTAS COLABORADORES para o Serena- West (Blog)!!! Você escreve textos sobre assuntos variados? Sobre um assunto só? Você não escreve mas conhece alguém que escreve? Essa é uma boa oportunidade!!! Caso você se interesse, estou recrutando colunistas pra diversos assuntos, entre em contato comigo pelo meu e-mail:

julianeschimel@gmail.com  


P.s.: Não remunerado. 

4 de setembro de 2016

Se você escolher ler esse texto, é bom que tenha estômago.

Tendo em vista tudo que eu venho passando já há 1 ano e seis meses, sobre o câncer, eu acredito ter visto, e sentido, mais coisas que muitas pessoas que aderem campanhas de prevenção ao câncer na internet e outras mídias. E assim sendo, a última moda das fotos preto e branco, me deixou muito aborrecida, mesmo sendo prevenção, porque não foi feita de maneira clara, postar uma foto com uma legenda irrelevante, não é campanha, postar uma foto, não é campanha, não contra o câncer, e eu vou me explicar, porque tudo sobre câncer, quando você fala em diagnóstico, precisa ser claro. Eu fiquei me perguntando todos esses dias, se as pessoas que aderiram essa campanha, fizeram algum exame periódico em algum hospital/clínica, ou auto exames que são preventivos desde que que você não ache um nódulo. Porque o certo, o correto, é fazer exames hospitalares periodicamente. Eu não posso dizer que tenho câncer, porque achei um nódulo palpável em alguma parte do corpo. Existe um processo inteiro que envolve consultas médicas, exames de sangue e biópsias, que vão dizer se um nódulo é um câncer ou não. Quando eu procurei assistência médica, porque tinha nódulos no meu pescoço, eu passei por três médicos diferentes, até chegarem a conclusão de que eu precisava de uma quarta médica, que era uma hematologista, com ela, antes da biópsia, foram dois meses de consulta semanal. E sabem, meu estado clínico era visivelmente crítico. Existe um protocolo sobre o câncer, que diz que o paciente suspeito da doença, deve ser diagnosticado e entrar em tratamento em até 60 dias. E eu posso dizer pra vocês, sem sombra de erro, que isso existe para quem tem dinheiro. Meu diagnóstico demorou 4 meses, e eu depois desses 4 meses, foram mais 2 meses pra iniciar a quimioterapia. Hoje, a espera por uma biópsia, pode demorar até seis meses, dependendo do nível de importância que o médico der para o tratamento, o mesmo vale para cirurgias de remoção de tumores com metástases. Eu não estou vagando sobre estatísticas, isso é o que eu presencio todos os dias no hospital. A cidade de Petrópolis, não tem um centro oncológico que trata todas as doenças do câncer. Quando eu finalmente recebi o meu diagnóstico de linfoma pelo hospital Alcides Carneiro, que aliás devo ressaltar, não teria me atendido com urgência se não fosse a intervenção de um vereador, sem a intervenção dele, minha consulta inicial teria demorado quatro meses, enfim, quando recebi meu diagnóstico inicial, fui encaminhada ao CTO, debilitada, esperei por 6h até que fosse atendida por uma médica num encaixe. Dentro da sala dela, ela muito rude, me disse a verdade nua e crua: "Se você optar por se tratar em Petrópolis, eu posso te passar quimioterapia, porém, aqui eu não tenho PETSCAN, e não tenho como fazer o exame Histopatológico da sua bioópsia pra te dizer qual é o seu tipo de linfoma, eu posso até te passar uma quimioterapia, porém, sem saber se é a medicação certa, se eu fosse você, ia pro INCA, no Rio, se você ficar em Petrópolis, você vai morrer". Pra quem não sabe, o PETSCAN, é uma tomografia especializada, que usa o flúor como contraste, e esse exame vai além da tomografia, o PETSCAN capta a atividade do câncer, dentro de um tumor. E Petrópolis não tem. E eu me pergunto, como se tratam os doentes de câncer em Petrópolis? COM FOTOS PRETO E BRANCO, NUM MURAL DO FACEBOOK? Petrópolis tem 400 mil habitantes, digamos que 150 mil sejam mulheres, como essas mulheres se viram com apenas 1 mamógrafo gratuito? Quem pode pagar por uma mamografia semestral ou anual? Não vamos ser hipócritas. Escrevi tudo isso pra corroborar a minha luta, de que palavras, NÃO PRESTAM PRA NADA, NA REALIDADE DE QUEM TEM CÂNCER, E NA REALIDADE DE QUEM CUIDA DA PRÓPRIA SAÚDE. O que adianta uma campanha pra conscientização da prevenção, se não existem meios preventivos efetivos? Ou se quer meios rápidos e eficazes de diagnóstico? E ainda caímos em outro paralelo, não adianta você ler sobre uma luta, uma simples leitura, não te torna alguém experiente. E ainda outro extremo, ninguém iria pinta o rosto com tinta preta pra conscientizar a sociedade, de o negro precisa ser respeitado, até os gays fazem passeatas pra terem seus direitos respeitados, as feministas também se representam e muito bem, e todas essas pessoas não admitem que outras vocês pouco efetivas, manchem as suas causas. Então eu me pergunto: PORQUE EU FUI TACAHADA DE "CAUSADORA DE CASO", "FAZEDORA DE MIMIMI, QUANDO CHEGOU A MINHA VEZ DE REPRESENTAR A MINHA CAUSA, E DIZER QUE ACHEI UM ABSURDO UMA VOZ SEM NEXO, QUE FOI ESTA CAMPANHA DA FOTO PRETO E BRANCO, DIZENDO PRAS PESSOAS SOBRE UMA LUTA, DE FORMA ERRADA. Depois que eu e o meu noivo nos expressamos, li algumas postagens de pessoas que de doeram dizendo: "o mural é meu e eu posto o que eu quiser". Sim, o mural é seu, você posta o que quiser, MAS A LUTA É MINHA E EU DEFENDO A MINHA CAUSA COM UNHAS E DENTES. E a minha luta não é na internet, tentando mostrar que eu sou uma boa pessoa, postando foto de causa que eu não conheço, a minha luta diária, é por mim e por milhares de pessoas com câncer, que são abandonadas de todas as formas. A voz da nossa causa ainda não é forte como a voz do movimento negro, feminista ou gay, mas ela vai ficar forte, no que depender de mim, que sempre lutei pra tudo na minha vida, por tudo que eu estou passando, minha história não vai ser a história de uma guerreira de venceu o câncer, minha história é a história de alguém que dá voz a quem não tem.

23 de maio de 2015

Segunda- feira

Da série: [se você pudesse me ler]
(isso é só uma coisa que eu queria dizer, como tantas outras que os outros dizem, se você pudesse me ler...).
Eu estou me preparando psicologicamente pra segunda feira. O que eu posso dizer? Que odeio agulhas? Que vão picar meu braço pelos menos umas três vezes antes de achar a veia certa? Que não quero colocar um cateter? Não quero colocar um cateter, a médica disse pra mim da última vez: “Ainda estão conseguindo achar suas veias? Vai chegar uma hora que eles vão pedir pra colocar um cateter.”. A única coisa que eu pensei foi numa futilidade sem fim: “Não quero mais uma cicatriz.”. Egoísta não? Sou humana, não estou pronta pra lidar com isso. Não é romântico ser cortada e costurada, ou ficar com pontinhos roxos por causa de picadas. Alguém tem que dizer (de novo), pra Carolina Dieckmam, que cortar o cabelo não é a pior parte, eu tive que dizer isso pra mim mesma, a tia Ana também me disse. Por falar na Carol, foi divertido cortar o cabelo (agora que acabou), acho que estou pronta pra falar disso (só não estou pronta pra falar de amor). Minha tia Ana me contou os bastidores: “Quando a Débora estava lavando seu cabelo, ela me mostrou o quanto de cabelo estava caindo e eu fiquei assustada; depois que ela cortou e foi fazer a escova, eu pensei que seu cabelo ia cair muito.”. Eu disse que estava caindo, é que eu sou muito educada pra falar as coisas também, eu devia ter dito: “está caindo pra caral.*&%$!” , não, o que eu disse: “tá caindo, é que tenho mesmo muito cabelo, e não cai como nos filmes sabe, não sai um tufo inteiro de uma só parte da sua cabeça, sai fios da cabeça toda”. Bem antes de me sentar pra lavar o cabelo eu avisei: “olha, não repara não, é que está caindo muito.”. Ficou aquela coisa no ar, tipo “todo mundo sabe, filha, mas ninguém comenta.”. Ela lavou, eu fiquei calada quase o tempo todo, e rindo de nervoso, é da minha natureza. Fico só pensando nas coisas. Então me sentei na cadeira pra cortar. Era a hora, não podia voltar atrás. Deu vontade de dizer: “posso ir ali ao banheiro ter um ataque de pelanca? Já volto!? Não?”. Mas convenhamos, eu já estava ali, o cabelo caindo, ela com a tesoura, nada de mimimi (não por fora, por dentro eu estava gritando). Pra uma mulher, o cabelo é uma parte muito importante do corpo, é a moldura fundamental. Onde vou passar a mão quando eu ficar nervosa? O que vou prender quando eu tiver uma boa ideia, por que eu tenho essa mania..., em que vou passar a mão quando um cara bonito me paquerar, (como se isso fosse possível)? Foquei num ponto qualquer e coloquei a alma no automático, por dentro, pedi pra ser rápido. Ela cortou a primeira mecha. Me senti com 10 anos de novo. Voltei bem no dia que minha mãe cortou minha franja e eu não queria mais usar franja, por que já era uma mulher. Quis ter 10 anos de novo e quis minha franja (bizarra) de volta. Ela não demorou mais que 30 minutos cortando, e lá se foi meu cabelo (meu cabeloooo). A conversa se animou, esqueci meus medos e começamos a falar mal dos homens e de como são lindos e gostosos, (que é o que mulheres fazem em banheiros e salões de beleza, e falamos do Christian Grey), uma moça chegou deu boa noite e logo soltou a pérola do meu dia: “Nossa que moça linda, você é modelo!?”. Pensei por dentro: “ah, pára!”. Sorri, e fui cortez dizendo obrigada. Minha tia logo disse que não. Nossa beleza é uma coisa de família. Quando a Débora terminou o corte eu me olhei no espelho, acho que suspirei, vi meus lábios enormes e meus olhos enormes, e de novo aquela sensação de estar enfrentando uma coisa nova me invadiu, quem era aquela ali no reflexo do espelho? O que eu mais havia detestado nisso tudo era a minha cara de doença. Ali no espelho eu vi a mulher que eu gostaria de ser. Eu sempre digo (pra mim mesma e amigas), que antes de amar um homem você tem que ser a pessoa ideal pra você mesma, e ali eu me senti assim: a mulher da minha vida. Por que raios eu sempre tenho que ver o lado bom de tudo? Por que eu tenho que dar razão pra droga do pensamento positivo? É um talento que eu tenho (kkkkk), e muita prática em sempre ser a última da fila, aquela que sempre toma banho de poça d’água, é necessário muito bom humor pra lidar com as adversidades e por algum motivo no universo, eu sou a pessoa. Olha, tem gente que vê o câncer como um bicho papão enorme, e eu admito, tenho medo pra caramba, mas ele não me intimida, é difícil lidar com o fato de que somos uma bomba relógio caseira, mas são muitos anos trapaceando o azar, tirei meu diploma. Ah, o cabelo. O meu cabelo é mais um preço que estou pagando pra ficar boa, mas teve um dia que eu meio que olhei pro céu, já estava de noite, e já tinha estrelas (a culpa não é delas, já que tocamos no assunto), mas eu questionei sinceramente “por que eu”, disse pra Deus que ficar careca já era demais, afinal, eu já estou magra, disse que talvez era a hora em que ele deveria rever o roteiro do meu filme. Daí me veio na cabeça o que Rumi escreveu: “Eu irei oferecer meu coração para aquele que está doente da mesma doença. Os doentes podem beber a mim como se eu fosse um elixir.” O meu cabelo é preço pequeno diante disso, se eu ainda puder sorrir ou escrever. Eu não encaro o câncer como o fim da minha vida, de qualquer forma, por que não sou que decido sobre a vida e a morte. Tem uma coisa que eu estou tentando dizer, é que, eu também não estou preparada pra fazer quimioterapia, mas estou lá de quinze em quinze dias, sorrindo. Quando a enfermeira não acha minhas veias, eu não reclamo, ela pede desculpas, acaricia minha mão e viramos boas amigas. Não é só vocês que se compadecem, eu queria muito dizer isso pra minha família, as vezes vejo que carregam esse fardo sozinhos, especialmente minha mãe e a tia Ana, dá pra ver nos olhos sabe, as pessoas ficam querendo tirar minha dor, infelizmente, e acho que elas também pensam assim, não é algo que passe com mertiolate (é assim que escreve?). As vezes nós, os doentes, também entramos numa onda de autocompaixão (acho que isso pode ser um tanto óbvio, ninguém é de ferro), tem dias que eu nem quero lembrar que estou doente, por que sou vaidosa, egoísta e por que eu sou um pouco fútil também. Minha preparação psicológica inclui meu remedinho de enjoo, sou chatinha quando fico enjoada, não gosto que me toquem, não quero que me vejam vomitando e sim, se eu puder, após vomitar eu retoco minha maquiagem, por que não estou pronta pra me olhar no espelho e  ver qualquer pontinha que indique que eu possa vir a fracassar. É uma coisa que todo meu ser faz em conjunto. Um equilíbrio total entre mente, coração, alma, espírito e estômago e/ ou fígado. E cortar o cabelo mexia com esse equilíbrio, agora eu acho que não mexe mais. Fazer “quimio” ainda mexe com esse equilíbrio, e tudo que penso é em não desequilibrar quem me carrega quando eu fico mal depois da sessão, é uma arte, eu concluí que viver é uma arte. E Rumi tem a completa razão.
“Seja como o sol pela graça e misericórdia
Seja como a noite para cobrir as faltas dos outros
Seja como a água corrente pela generosidade
Seja como a morte para a raiva e o ódio
Seja como a terra pela modéstia
Pareça ser aquilo que você é

Seja aquilo que você parece ser.” (Rumi, poeta sufi)

20 de maio de 2015

Na luta contra a segregação

Da série: [se você pudesse me ler]
(isso é só uma coisa que eu queria dizer, como tantas outras que os outros dizem, se você pudesse me ler...).
Vi um troço legal a internet hoje, de uma iniciativa não governamental que visa conscientizar as pessoas perante o governo, até postei mais cedo, para reivindicar os direitos das pessoas com câncer, esse assunto não pode ficar batido assim como os outros assuntos políticos que nos envolvem. É fácil assistir o jornal e ficar a par das notícias, certo? Mas e se podemos fazer algo? Assinar uma petição via internet, que seja?! Temos que pensar coletivo pra fazer valer o individual. Assim como eu estava comentando com meu pai esses dias, eu acredito que as igrejas tinham que ter um envolvimento mais efetivo dentro da comunidade que elas habitam, sabe, não apenas portas abertas, mas sem paredes também. A vida de uma pessoa pode mudar por causa de um trabalho de crochê, não só financeiramente, mas a nível humano, de dignidade. Eu penso que eu acredito demais no ser humano e peco por isso, enfim, acabo achando que as pessoas merecem credibilidade pelo simples fato de que possuem inteligência, sentimentos também. E eu penso que temos mesmo que mudar nossa visão de mundo. Deixar de olhar apenas nosso quadrado, nosso “inBox”, e olhar ao redor, deixar de olhar apenas o “eu existo”, o “eu sou isso ou aquilo” e ver que no mundo “existem” mais pessoas que são “isso ou aquilo”. Dentro de uma família não existe só um pai, é um nicho, pessoas possuem características diferentes e habitam no mesmo lugar, é fantástico! Seria mais fantástico ainda se eu olhasse pro outro e visse as qualidades dele somada ás minhas. Eu não sou expert, mas dá caldo! Eu sempre acreditei que o diferente quando se junta, se torna extraordinário, talvez pelo fato de não ser muito ortodoxa, ou de não aceitar bem o termo “diferenças”, não adianta, não é uma coisa que eu consiga encaixar na minha lógica. E é nesse ponto que eu quero chegar, a sociedade nos separa por classe, cor, função, peso, estética, posição monetária, condição de sáude... de quem é esse poder e porque? Não me enxergue mal, não sou socialista, (não que seja ruim ser socialista, é que eu prefiro o capitalismo, aliás por questões muito egoístas, eu admito. O quê? Não sou perfeita.), pelo contrário, mas não é uma questão de senso comum? Talvez eu esteja errada, e até aceite correções. Por que as minhas roupas, a minha cor e minha posição monetária, ou minha condição de saúde têm que ditar minha posição na sociedade? E por que em nome de Deus, nós ainda temos que ficar socando a cabeça na parede implorando pro governo dar uma melhor condição de saúde e etc., pra população? Jesus, Maria, José e o camelo se viraram muito bem numa estrebaria, mas hoje em dia a parada é outra. Certo? Os nossos governantes e até nós mesmos, nos separamos em classes pra facilitar os processos de “segregação” ou isso é só por maldade mesmo? E se você pensa que não estou usando o termo certo pra isso, vamos ver o significado da palavra segregar.
Segregação é o ato de segregar, de por de lado, de separar, isolar ou apartar.
Segregação é o processo de dissociação mediante o qual indivíduos e grupos perdem o contato físico e social com outros indivíduos e grupos. Essa separação ou distância social e física é oriunda de fatores biológicos e sociais, como raça, riqueza, educação, religião, profissão, nacionalidade etc.
Estamos de braços cruzados na luta contra o câncer, contra a violência infantil, contra a pobreza, contra a corrupção, contra tudo. E sabe por quê? Por que a novela das oito, diz que morar num barraco é legal. Vou te explicar, lá é cenário, lá não mostra a falta de saneamento básico do básico, do básico que é o direito a uma privada com descarga. Não quero ofender o trabalho dos artistas, mas a arte imita a vida? Ontem na novela das nove, a antagonista é pega desviando verbas de projetos na compra de materiais que foram superfaturados, a outra que eu acho que deve ser uma protagonista antagonizada, disse o seguinte: “O problema não é você desviar dinheiro, o problema é pra onde você o mandou!” Eu não assisto, mas passei de relance nessa cena e resolvi parar pra pensar: “Que país é esse?!”, onde na TV se fala de corrupção e nada é feito, onde se fala do caos da saúde pública e nada é feito, onde pessoas são privadas dos seus direitos, segregadas, e nada é feito, por mera questão de status social, por dinheiro, por que você se acha bom de mais pra protestar, porque vai deixar sua imagem queimada com “os mano” se você reclamar? Você vai às urnas no dia da eleição e pronto, seu dever cívico está feito, você trabalha e paga seus impostos, tá beleza. Sério mesmo? Enquanto a crise não nos atingir é fácil cruzar os braços. Enquanto não somos nós os doentes, é fácil virar a cara. Enquanto não somos nós os violentados, assassinados, miseráveis e rejeitados, tudo ok. É por essas e outras que eu gosto dos artistas, eles botam a cara no sol. E nós? Nós damos boa noite pro William Boner e só? Olha, não precisa ir longe, na internet existem projetos que você pode participar, do lado da sua casa existe uma escola pública, um posto de saúde, não dói fazer uma visita pra quem precisa de um sorriso; já que você não pode mudar uma lei sozinho, não custa nada fazer uma campanha de doação de agasalhos e brinquedos, não machuca fazer um mutirão de reforma de casas, no próprio bairro; não custa nada montar uma cooperativa que ajude diversas pessoas na sustentabilidade delas, incluir as pessoas dentro de uma sociedade justa não tem custo algum a não ser o custo pessoal, que é algo que fazemos pelo bem coletivo. São as pequenas atitudes de amor e carinho que mudam o mundo.


19 de maio de 2015

Câncer

Da série: [se você pudesse me ler]
(isso é só uma coisa que eu queria dizer, como tantas outras que os outros dizem, se você pudesse me ler...).
Como eu ia dizendo, o câncer rouba muita coisa da gente, mas eu também sou trapaceira. Bom, eu acredito que ter qualquer doença não seja fácil, já tive resfriados em que não aguentei sair da cama, quem nunca? E sempre que ficamos doentes, bem, existe uma norma de conduta, se não sabe o que dizer, é simples, não diga nada, aos que sabem, meu “muito obrigada”. Desde meu diagnóstico eu passei por muitas fases... É difícil enumerar por ordem o que o câncer fez comigo, então vou mencionar o que em mim teve mais impacto. Minha primeira pior experiência foi o dia do primeiro diagnóstico, quando me disseram que era só um cisto, quisto, seja lá o que fosse, eu pensei, “a mensagem que meu corpo está me passando é de algo mais grave, alguém, por favor?”. Me vi em pouco sem saída. No dia meu pai ficou tão feliz que resolvemos sair pra comemorar, só um caroço pra ser retirado com uma cirurgia. Mas eu não me convenci, eu sabia que não era só aquilo. Guardei aquilo pra mim. Então o cirurgião me transferiu pra uma hematologista, (dois santos na terra). Logo depois veio a biópsia, não consigo me lembrar na minha vida, de um dia que tenha sido tão longo e cansativo como aquele, lembro-me de ter chorado muito, lembro-me de não ter forças se quer pra andar, lembro-me de três mãos apertando as minhas, a primeira da minha médica, que disse: “Ju, nós não vamos desistir, vou conseguir sua biopsia pra hoje ainda, nem que eu precise arrumar outro médico!”. A segunda mão foi a do médico que ela “improvisou”, ele segurou minhas mãos com as duas dele e disse que tudo correria bem. A terceira mão foi a do médico que ela tinha conversado pra fazer minha biopsia, ele tinha ficado preso na serra por causa de um acidente, ele pegou minhas mãos e disse: “Vamos lá!”. Durante certo tempo o câncer me roubou a cor, eu era apenas branca como uma folha de papel, e frágil, e ficar acordada durante uma cirurgia e saber que estão tirando uma parte sua pra te dar uma má notícia, não é legal. Hoje eu olho a cicatriz na axila, e admito, me incomoda, assim como as outras cicatrizes, a da biópsia da medula que é diferente da cicatriz da axila, é só um ponto na minha lombar, ela me incomoda, é minha lembrança de superação. Marcas de superação. Tem dias que eu preciso muito chorar. O câncer me roubou a autonomia. Sabe, eu montei toda minha casinha dos sonhos, morar sozinha é um barato! Andar de meias pela casa é um hobby pra mim, entre outras coisas que fazemos quando estamos no nosso lar e nenhum um outro lar é melhor que o seu, pois ele pertence a você. Aquele era meu lar, o lugar onde eu finquei as raízes da Juliane. Atingi o auge máximo que uma pessoa solteira ambiciona na sua autonomia, parei de lavar as roupas na lavanderia e finalmente comprei minha própria máquina de lavar; 8kg, com economia de água, chupa essa manga! A máquina só faltava falar! Mas como essa seria uma boa história de superação se eu não tivesse o amor incomensurável da minha família? Pusemos tudo num caminhão e lá se foi minha máquina pro sótão da casa da minha avó. Sonhos em conserva e devidamente empacotados, estes ficaram pra depois. A biópsia da medula. Putz, aquilo foi doloroso. Ficar na posição fetal sem ser um feto, e sabendo que vão usar uma agulha e o caramba pra pegar um pedaço do seu osso, não é legal. Eu estou magra, 10kg pra quem já era magra fazem muita falta, ossos quando batem, doem hahhaha, o caso é que não achavam o meu osso! Eu não gosto nem de lembrar, no lugar de dois furos, me fizeram cinco. E a anestesia? Não me lembro dela ter feito muito efeito. De um a dez, a escala da minha dor foi 9.9, o dez eu guardei pras inúmeras vezes em que ainda vão furar meus braços com agulhas. Quando eu olhei pro médico lindo que fez a biópsia de medula, eu estava chorando copiosamente, tive a impressão que ele queria me pedir desculpas. Ele era lindo mesmo, moreno, nem tanto, barba por fazer, nem tanto, alto, voz de locutor de rádio, (meu número kkk), eu chorando de dor, me senti estúpida, não por ele ser lindo, mas por eu sentir dor. Nunca esperamos que na vida, certa dor nos está de certa forma, de algum modo, em algum momento, predestinada. É disso que eu me lembro de quando ao longo que desses meses encontrei várias pessoas no meu caminho, umas realmente me apoiando, outras apenas curiosas, umas outras educadas, umas poucas sem palavras, e bem... Algumas, realmente idiotas. Ouvi certa vez o seguinte: “Essa doença é um pecado que você cometeu. Peça perdão pra Deus que ele te cura”. Outra: “doenças como a sua são as mágoas que você tem guardadas, você precisa liberar perdão”. Como uma pessoa sensata lida com isso? De maneira sensata, eu suponho. Mas como eu não tenho mais nada a perder e sou uma sensata com requintes de lunática, e não me levem a mal, eu não esperei as frases serem terminadas, eu virei as costas literalmente, por que eu sou muito capaz disso e fui viver, eu sou desapegada demais as vezes. Já me taxaram de fria, mas sou pragmática. Pra que discutir com alguém que não nos conhece? No final, acaba sendo sensato, que sejam felizes com suas filosofias, a minha é, Deus não tem nada a ver com isso, meu corpo de defeito, deu zica mesmo sabe, a medicina explica, estamos tratando, se Deus quiser fazer algo através disso, não se preocupem, eu não estou preocupada, ele é o dono da casa. Então, onde estávamos? Sim, ter um câncer nível, estágio, fase  QUATRO (4) chame do que quiser, não é legal, assusta, é grave. É como estar na última fase do seu jogo preferido e saber que não pode dar reset e recomeçar na primeira fase, é como estar na tábua da beirada de um navio e lá em baixo o tubarão. Lidar com a morte todo dia, saber que pode ter uma embolia pulmonar e simplesmente deixar de existir, dá medo. As vezes eu tenho que chorar em silencio por causa disso, por que a sensação que dá é que ninguém vai entender realmente o que eu estou passando, que na verdade não é só um câncer, é a minha vida que eu estou agarrando, mesmo com câncer. Então, o câncer é meu, é um problema que eu agarrei com as minhas mãos e estou tentando resolver, embora seja plenamente amada por isso e apesar disso, e não tenho vergonha disso. E por ele estar dentro de mim, às vezes tudo se mistura. Perdi um amor, mas disso não vou falar, não sei quando, mas teve um dia que desisti, só desisti. Desistir dos cabelos. Não desisti, tenho que agradecer a Débora, mil vezes, por mil anos, por ter feito esse corte no estilo daquela garota Hanna Montana rebelde kkkk, qual é o nome dela? Nunca lembro, minha memória falha as vezes. Eu rezo pra não ser dramática, quero ser prática, mas as vezes eu caio nesse pecado do drama, e puxar seu cabelo e ver ele saindo na sua mão... não é legal. Eu achei que estava preparada pra isso, afinal, não estava. Eu chorei sozinha com um tufo de cabelos nas mãos por meia hora me imaginando feito um  “E.T.” com a cabeça lisa como um ... como o que? Eu não sei, não quis pensar muito, não quero pensar nisso, mas o cabelo, justo o cabelo que tá bem ali onde eu penso.. quase na minha cara. Então a gente tem que pensar que são coisas da vida, propósitos divinos e a nossa vida parada, e questionamentos surgem de todos os cantos da alma, e eles quase gritam: “Doente e careca, quem vai me querer?”,  “Vão me olhar com pena”, “Ou não vão nem olhar, vão evitar”, “Minha vida está parada e agora?”, “qual será o meu futuro”. Guarda isso, vou dizer a última coisa que mais me impactou e vou usar essa última questão só pra explicar por que não é necessário me desejarem mais força. Fazer tomografia, pet scan, exames de sangue toda semana, e os caramba, o procedimento mais simples de todos, envolve agulhas e meus braços e mãos, tenho marcas, e se eu não aguentar o tranco, bem, ultimamente eu choro. Chorar em publico não é comigo, sou do tipo que aguenta sorrindo, mas tem hora que não dá. Mas “tá de boa”. Quero falar da minha última quimioterapia, descer a serra de Petrópolis, entrar num hospital e sentar numa maca sabendo que vão furar seu braço e depois de tudo você ainda vai vomitar, não é legal. Dessa última vez me parece que vomitei minha alma. Fiquei até com medo de dar descarga e deixar minha coragem descer junto. Minha sensação essa semana quando minha mãe quis falar sobre a próxima quimioterapia, foi de náuseas. Eu escondi a bolsa, os sapatos e as roupas que usei naquele dia, por que parecia que eu estava sentindo o cheiro dos remédios e depois eu tive vontade de sumir por alguns minutos. No dia da quimioterapia eu fico mal, não dá pra andar, teve uma vez que vi as coisas em dobro, meu pai me segurava pra eu entrar no carro, e ele disse assim: “Põe seu pé dentro do carro filha!” e eu respondi rindo: “qual dos quatro?”, me pareceu engraçado. E bem, a medicação é forte, minhas veias dos braços doem, então é aí que eu penso: “Qual será meu futuro?”, é agora que você entende por que não precisa me desejar nada... Eu já tenho as minhas respostas, estou plena. Acredito que pelo menos uma vez na vida todos os seres humanos recebem a oportunidade de reconhecerem que são plenos e isso só acontece em dois casos, o primeiro, diante da vida e o segundo diante da morte. Eu recebi o dom da vida ao nascer dos meus pais (faço questão de ressaltá- los, tudo que eu sou vem deles, do dedão do meu pé até meu último fio de cabelo), usei esse tempo pra crescer e aprender muitas coisas, eu aproveitei tudo ao meu redor (dentro dos meus princípios, sem escrúpulos), e fui colocada plena diante da morte, mas eu fui (sou) tão amada, que na verdade não me importaria morrer, e a morte (embora me amedronte muito mais pelo desconhecido), eu acho que ela não suporta o amor, por que é o amor que tem me sustentado e acho que ela também não suporta as verdades de quando somos honestos (serei redundante e vou escrever errado srsrrs), “conosco mesmos”. E eu nem deveria ser tão pretensiosa, isso pra alguns deve ser até grosseiro da minha parte, mas bem... Estou plena em vida, descobri que todas as respostas que eu preciso pra hoje, eu já tenho, que tudo que eu sonhei, foi conquistado, que as pessoas que eu amo e que completam minha vida, já estão ao meu lado, e o futuro... É agora, meu futuro é a minha vida e a minha morte. E o câncer está indo embora dela, (segundo minha médica, Dra. Márcia, linda e simpática). Então, o medo na verdade é uma coragem, e devo apenas concluir que sou só uma pessoa com um sonho pra sonhar, e que se eu me misturar na multidão (que Deus me permita), nem vão perceber que na verdade eu sou uma trapaceira e enganei a morte.

Essa é a minha marca de superação.